domingo, 30 de junho de 2013

De que lado você samba

É praticamente deprimente o tamanho de minha ignorância política. Mas, como consolação percebi que praticamente todos os meus amigos encontram-se na mesma. Pois, minha geração pós-ditadura cresceu num silêncio amedrontado. Política e religião não se discute, nem se conversa, nem se ensina, apenas deixa-se um rombo na sua formação humana.

Mas, não é que mesmo com toda essa apatia saímos do casulo? Alguma coisa está errada, não estamos felizes, não sei o que é executivo, legislativo e judiciário, nem onde começa um e termina o outro, nunca li a constituição, mas, ao que parece o Brasil tem muito dinheiro e pouca infraestrutura, isso mesmo o mais leigo dos leigos é capaz de perceber. Mesmo a mim, que aprendi na escola o funcionamento de uma célula e a função específica de cada organela, mas nem imagino o que de fato seja um banco e como se fazem dinheiro, e nunca foi me dito que eu sou parte da política e tenho o poder de mudá-la. Interessante, aprender as forças que movem o bloquinho numa rampa mas pensar que as leis e a economia vêm de um ser supremo, distante e superior a mim, algo inquestionável.

Pois bem, acordamos. A expressão não é tão exata, pois ir a rua fazer política não significa que passamos a ser politizados. Não é como acordar, dormindo num instante e desperto no segundo seguinte, é mais como começar uma caminhada, saímos do lugar, demos o primeiro passo. O que foi absolutamente positivo, não apenas para pôr pressão nos governantes, mas principalmente, para preencher a lacuna, o espaço oco na nossa formação humana.

E o vazio era tão grande que não sabíamos nem o que dizer. Conversando com amigos percebi que não sabíamos nada de política. Víamos como se não estivéssemos inclusos, como se não fôssemos parte da política, talvez isso se deva a nossa formação de oceanólogo que separa o ser humano e estuda o meio ambiente descolado do social. Nas conversas senti que uma amiga que demonstrava uma postura bastante liberal criticava alguns textos dizendo, "ih Keith, não sei não, mas essa papo aí é muito de esquerda". Ué, mas tu é de direita? Foi aí que me dei conta de que vínhamos confundindo PT com esquerda, tá certo que originalmente o PT era um partido de esquerda, mas não são sinônimos, esquerda e direita é um modo de pensar, pelo que estou entendendo. E que mesmo sem partido, mesmo sem falar de política, mesmo sem saber, tendemos à um lado ou outro.

Acho que saber de que lado estamos auxilia na hora de seguirmos uma linha de raciocínio. Não que devamos nos prender em pensar apenas no imposto por esse perfil. Mas, pelo menos para compreender os termos. Aliás, isso é outra coisa que tem me divertido muito. Eu usava palavras sem saber o significado, ainda não sei profundamente, mas só de consultar o houaiss já tô mudando um pouco o emprego de algumas palavras. O tal reacionário por exemplo, é "hostil à democracia, se opõe à ideias voltadas para transformação da sociedade", para mim parece estranho pensar que algumas pessoas são conscientemente reacionárias, acho que a maioria dos classificados nesse grupo apenas reproduzem um padrão sem se questionar. Pois quem em são consciência não seria revolucionário, "que se caracteriza pela possibilidade de renovar os padrões estabelecidos", quando temos esses padrões esquisitos de hoje?

E o que é pior, sabe aquela palavra que deixa um clima tenso no ar? Anarquia. Pois então, significa a negação de qualquer tipo de autoridade. Tipo, esse movimento lindo, livre e espontâneo que acabou de rolar. Acho que tenho tendências anarquistas! Afinal, como nos faz refletir Thoreau:

"Deve o cidadão, sequer por um momento, ou minimamente, renunciar à sua consciência em favor do legislador? Então por que todo homem tem uma consciência? Penso que devemos ser homens, em primeiro lugar, depois súditos."

E se afinal, devemos nos conhecer a nós mesmos, convido-lhe a fazer o teste de posição política: http://www.politicalcompass.org/test

Já tem algum tempo que tenho buscado preencher essa lacuna político-social. Para mim tem sido uma terapia, por responder a desconfortos que eu não sabia a origem. Se me achava estranha e esquisita, agora sei que na verdade eu tenho uma posição política que difere em muito do que minha família, a escola e a mídia defendem. Pois é, eu realmente acho que os melhores livros de auto-ajuda são os livros políticos, e o famoso "conhece-te a ti mesmo" também se refere à política.


sexta-feira, 28 de junho de 2013

Emancipação

A corrupção é de fato um dos piores mal do Brasil. Medidas desesperadas estão sendo tomadas para tentar barrá-la e fazer com que as migalhas cheguem em maior volume ao público. Mas, será mesmo que leis são capazes de mudar esse cenário? Será mesmo que verbas oriundas do petróleo são capazes de nos dar a tão pedida educação?

Num primeiro momento acreditei que sim. Mas fiquei pensando como seria a materialização desse repasse de verbas. Me lembrei da guria que fez uma página no face "diário de classe" que expunha o total descaso da administradora do colégio, dinheiro até tinha, o que não tinha era uma administração competente. Acho que são professores que administram escolas. Mas, como podemos deixar tal função para o licenciado em história por ser mais simpático e "informado"?!

Ao ler o texto Ao povo na rua, dinheiro me dei conta de que nossa educação já é falha por depender financeiramente do estado, e assim, servir inevitavelmente para reprodução dos seus interesses. Agora iremos, nas escolas, trabalhar para o interesse do estado e petrobrás. Aumentando a dependência dessa.

Mobilidade urbana idem. Estamos caminhado para aumentar a dependência da população pelo estado, e desse pelas grandes corporações. Oras, para mim isso é mais importante de se combater do que a corrupção. Essa "escravidão moderna" é que nos está saturando de verdade. Não o capital por si só, ou a corrupção do estado, mas nossa dependência (crescente) desses.

Seria necessário medidas emancipatórias. Você conhece algum pequeno empresário? Te digo, são verdadeiros heróis. No Brasil não há espaço para inovação, a alternativa mais fácil é se vender de assalariado para uma megacorporação, essa sim, tem facilidades de imposto, influência no estado, fazem e acontecem. Aí está o problema, aí nasce o corruptor que exatamente nesse instante está com um sorriso faceiro e vitorioso, não ter que pagar propina vai aliviar bastante seus gastos! E nós, população e estado, estamos caindo numa enorme cilada.
Medidas disfarçadas que no fundo só visam lucro monetário de pucos.

liberdade É certo e inegável que a corrupção é algo inaceitável. Mas, talvez tenha que ser combatida na causa, na raiz. No corruptor. Meu irmão tentou algumas vezes ser empresário, a primeira foi com uma empresa de ploter. Ele mal tinha dinheiro para pagar as máquinas, certamente não teria tanto dinheiro para corromper ninguém, de modo a ganhar uma licitação (como lhe foi proposto). Empresários locais, tendem a se interessar mais pelo desenvolvimento de sua cidade. Eles podem fazer empresas em sua própria residência. Isso significa muita coisa, uma das pautas das manifestações e do descontentamento geral é mobilidade urbana, isso porque os empregos estão centralizados e a população mais carente "periferizada", criando "pólos" de emprego, pequenas empresas domiciliares, isso diminui. Mas, então, talvez nosso foco tenha que ser a política do BNDES. Ou o modo de educação, que atualmente é voltado para reprodução do que está dado, inclusive na universidade. Quase não existe outra alternativa que não a de ter carteira assinada. Estamos todos a disposição da iniciativa privada de megacorporações.
Com falta de opção a única saída é vender-se.
igualdade O mesmo com os latifúndios. Caramba! Isso é um antro de corrupção, a bancada dos ruralistas. Essa concentração de terras beira o absurdo. Os impostos deveriam crescer exponencialmente. Não só sobre terras como sobre patrimônio. Se isso iria impedir o progresso tecnológico, eu acredito que não, mas as grandes empresas seriam mais parecidas com cooperativas e associações. Isso já existe, embora seja estrategicamente abafado, desincentivado e jogado pra segundo plano. Com uma educação voltada para a criação, cooperação, inovação, nuossa, aí sim, seria potencializar o que já existe de bom no ser humano.

fraternidade Atualmente parece que temos que fazer um esforço sobre-humano para mantermos nossas virtudes. Às vezes eu me vejo fazendo de tudo para me agarrar na pureza, na humildade, em reconhecer um irmão no ser humano ao lado, e me puxa pela perna com muita força, a ganância, o individualismo, a pressão para desconfiar no malandro ao lado, eu tenho que estar sempre muito atenta para identificar e combater essas tendências... Será que não devia ser o oposto? Os que tem essa tendência gananciosa, opressora, autoritária e individualista que deveriam se sentir socialmente pressionados a mudar? Pode soar meio moralista, talvez seja, minha ignorância sobre moral me leva a defender esses valores, mas não um moralismo conservador (eu acho), um moralismo que harmonize nossa vida social. E ao que me parece, solidariedade e humildade ajudam e muito no convívio social.

Minha alusão aos valores defendidos na revolução francesa não é uma tentativa de reproduzi-la, de importá-la. Até porque nem seria possível. Mas subir mais um degrau. De lá (tempo e lugar) pra cá muita coisa mudou, mesmo nosso entendimento de liberdade, igualdade e fraternidade. A aplicação desses conceitos continua bastante falha e incômoda. Acho que é esse incômodo que nos levou às ruas, pelo menos a mim. Ainda mais se contextualizarmos, com a crise na Europa, isso é, eles investiram na educação, mas nem por isso estão prósperos e felizes. Queremos abolição da escravidão moderna. Queremos a educação e trabalho libertários e emancipatórios, que dificilmente será comprada com dinheiro de petróleo.

Um dos homens mais revolucionários na minha opinião foi Gandhi. Ele trabalhou incessantemente pela emancipação da Índia, pois viu como a única forma de libertá-la da insistente opressão inglesa. As medidas adotadas por ele foram várias e que enfrentavam o governo, que defendia o interesse inglês. Usou da desobediência civil, ao usar sal marinho e assim não pagar o imposto obrigatório para o governo. Ficava horas fiando sua própria roupa, e difundia essa ideia, para libertar as pessoas de terem que pagar os preços absurdos por tecidos ingleses...
 
Emancipação

sexta-feira, 21 de junho de 2013

Todos os níveis de corrupção


Ontem, com meu cartaz de "é tanta coisa que não cabe no cartaz" fui às ruas. E de fato esse é "tanta coisa" me deixou muda, por um bom tempo, apenas observando, lendo cartazes e caminhando como boi para o abate. Mas, minha vontade era gritar, extravasar a raiva que eu sabia que devia estar sentindo. Mas, gritar o que? Contra a copa, a favor da saúde? Contra a "cura gay", contra a PEC37, contra a manipulação midiática, contra as tarifas do transporte público, contra a corrupção, contra a exploração, contra o capitalismo, contra o monopólio da noiva do mar?

Nesse turbilhão me dei conta de que nas passeatas de pequenos municípios, que certamente não terão repercussão estadual e federal, devemos nos focar na esfera municipal. E isso não é pouca coisa, pois que adianta o governo federal aumentar piso de médicos, liberar verba para construção de postos de saúde, e quando uma criança se afoga o médico do município não está no seu plantão, embora receba para isso? Se a saúde e educação é precária, parte do problema está em nível municipal.

E cadê a transparência? A noiva do mar devia ter sua conta aberta, afinal, quanto o governo, federal, estadual, municipal subsidia das passagens? Quanto imposto cobra? Quanto lucro a empresa tem? Quanto custou para o município a aquisição de novos ônibus? Onde está a licitação (que o jornal aponta que o prefeito se deu conta de que é nula, o que isso significa? não houve licitação?), o que diz o contrato? Que empresa é essa, ela gerencia outros negócios?

Muitos questionam a eficiência de um movimento apartidário, como se fosse sinônimo de apolítico e ilegitimo. Mas, muda-se partido e as perguntas continuam as mesmas. Que diferença vai fazer ter partido na manifestação? A única diferença vai ser entrar numa disputa de partidos, com a exclusão dos que se tornarem minoria. Existe diferença entre o governo de direita e esquerda, existe sim, mas existem semelhanças e é contra essas que estamos gritando. A cega corrida pelo "desenvolvimentismo" que vende o interesse público para o privado, embasado em um imediatismo imbecil, que não convence mais. Testamos e vimos que não funciona, o pólo naval é o exemplo próximo e digno de nota. Epa, epa, se é isso crescimento econômico, se é isso que se chama desenvolvimento, geração de "empregos" pára tudo, não gostamos disso.

E essa percepção não é municipal ou nacional, é mundial. Exatamente, dessa mesma insatisfação os europeus estão sendo vítimas a-go-ra. A crise, que é fruto de uma economia distante da realidade, está diminuindo a qualidade de educação, cultura e saúde nos "desenvolvidos". Atestando que investir em produção e consumo é o melhor passo para o fracasso, para a concentração de renda desumana e a deterioração de valores humanos não materiais (e até materiais, a riqueza não se materializa em infra-estrutura, ela vira ações, uma valor virtual que não quer dizer nada, na realidade). A corrupção está em todos os níveis, global, federal, estadual, municipal, privado em suas relações intra e inter, e combatê-la pontualmente está sendo desgastante e pouco efetivo.

Nesse complexo conflito que permeia diversas escalas não adianta estabelecimento de líderes do movimento para negociação com o estado. Como uma amiga defendia. Essas negociações com lideranças já existe, já acontece. Já existe uma guerra no senado, entre os que defendem o interesse público e os que se agarram aos interesses pessoais. Já se tomam medidas legais, partidárias ou não, com lideranças e não adianta. Cria lei, muda lei, estuda constituição, faz audiência pública que não adianta muita coisa. Se todas essas pessoas apartidárias, sem líderes, sem pautas documentadas, sem acordos para serem assinados, sem agenda, sem proposta, sem plano adianta? Eu acredito que sim. Quem tem que acordar são os que estão no poder (estatal ou privado) visando interesses pessoais diretos, e talvez essa movimentação os desperte. Os faça pensar, "ah, o ser humano não é egoísta por natureza, eu é que sou assim, o problema é comigo, que virei um monstro".

Voltando a esfera municipal. O foco desse 1º ato era o transporte público, que como revelei é envolto num mistério insondável. E para tentar expressar o que se passa alguns gritos foram proferidos em massa:

"Nem Fábio Branco, nem Alexandre, a noiva do mar é que manda em Rio Grande."

"Alexandre, se divorcia, noiva do mar não é boa companhia."

quinta-feira, 20 de junho de 2013

Da Copa eu abro mão

Esse momento político me deixa num êxtase que ando incapaz de elaborar qualquer texto. Meus nervos a flor da pele me levam a ler avidamente tudo o que está ocorrendo, e um turbilhão de pensamentos e sentimentos me envolvem, fazendo com que consiga no máximo participar de alguns comentários no face, e muuuuitas conversas pessoais!

Hoje haverá manifestação em Rio Grande com mais de 9.000 pessoas confirmadas pelo face. A cada minuto eu pensava em algo para escrever num cartaz. E confesso que passou de relance pela minha cabeça atear fogo na loja de um comerciante que monopoliza os aluguéis da cidade, com valores elevadíssimos e não dá nenhuma contra-partida. Calma, eu me acalmei e conclui que seria uma atitude totalmente estúpida. Enfim, acho que a marcha pacífica já é um grande ato por si. E conclui um cartaz assim:

"É tanta coisa que não cabe no cartaz"

Pois é exatamente isso. Alguns reclamam, essas reivindicações estão muito genéricas, é preciso pauta, e método científico para se alcançar qualquer resultado. Mas o que podemos fazer? As reivindicações pontuais que vem ocorrendo a décadas são sistematicamente ignoradas e abafadas? Sinto muito, mas se nossa indignação se acumulou, nada a fazer. Afinal é por isso que juntamos tantas pessoas, está tudo uma bagunça, em todas as instâncias governamentais pode-se achar sujeira. Começa no nosso pequeno universo universitário, que deveria ser um local público de intelectuais, na realidade é em alguns cursos um RH profissionalizante para empresas estrangeiras, zero capacitação para abrir e gerir empresas próprias (que aliás são supertaxadas, ao passo que megaempresas de capital estrangeiro são recebidas com tapete vermelho, e não é pela geração de empregos), zero inovação, quem não sabe de algum caso de concurso duvidoso?!

Putz grila, eu tinha vindo aqui falar da Copa. Mas, é tanta coisa...

Ok, vejam o que acabei de ler na Lei Geral da Copa, sim, foi aprovada ano passado e sim eu só li agora, e era de se esperar, afinal estava muito ocupada tentando evitar que mais pessoas morressem atropeladas na nossas estradas (que apresentam uma linda média de mais de um por mês, mas não se preocupe, a arrecadação da ECOSUL está ok, a empresa está dando lucro, é o que importa, e olha que linda, tem funcionário que ganha mais de 800 reais ao mês! yuhull). Enfim, observem o seguinte trecho:

Art. 37. É concedido aos jogadores, titulares ou reservas das seleções brasileiras
campeãs das copas mundiais masculinas da Fifa nos anos de 1958, 1962 e 1970:
I – prêmio em dinheiro; e
II – auxílio especial mensal para jogadores sem recursos ou com recursos limitados.
Art. 38. O prêmio será pago, uma única vez, no valor fixo de R$ 100.000,00 (cem mil reais) ao jogador.
Art. 39. Na ocorrência de óbito do jogador, os sucessores previstos na lei civil, indicados em alvará judicial expedido a requerimento dos interessados, independentemente de inventário ou arrolamento, poder-se-ão habilitar para receber os valores proporcionais a sua cota-parte.
Art. 40. Compete ao Ministério do Esporte proceder ao pagamento do prêmio.
Art. 41. O prêmio de que trata esta lei não é sujeito ao pagamento de Imposto de Renda ou contribuição previdenciária.

Calma aí, vamos ver se eu entendi, minha ignorância futebolística é espantosa, mas me parece que são 11 titulares e 11 reservas, 22 x 3 = 66. temos 6.600.000 reais de "prêmio", fora o tal auxílio mensal. e com o detalhe, livre de imposto...
A lei e repleta de motivos para indignação, responsabiliza a União contra danos à copa (das confederações e do mundo) e isenta a Fifa de despesas judiciais. Isso são apenas os artigos que a Procuradoria Geral da República questionou (só agora que o bicho tá pegando). Mas tem aqueles ainda, lembra que o pessoal da
Bahia reclamou por causa do acarajé?! O artigo continua na lei, dando exclusividade para a fifa num raio de 2 Km dos locais do evento...

Novamente, só sobre essa copa é tanto para se reclamar que num cabe nem no post, o que dirá no meu cartaz. E não "senso comum acrítico", não questionem "se já sabiam disso, pq só agora se manifestaram" pq não foi só agora! Deveriam se questionar "pq só agora a mídia não conseguiu abafar?". e eu respondo, pq as reivindicações transbordaram e se juntaram, afinal no fundo é uma coisa só: que o estado exerça sua função de regular o privado beneficiando o público, não o oposto.

domingo, 9 de junho de 2013

opressão do capital - parte 2

Na parede da biblioteca da FURG está escrito “nessa sociedade, só o capital é livre”. De início me pareceu algo bobo, sem fundamento, escrito por um filinho de papai que se julga socialista, rebelde sem causa. Hoje, minha percepção é outra.

Depois do breve histórico relatado no post de ontem, hoje compareci na manifestação. Tinha umas 30 pessoas. Eu imaginei que haveriam muito mais. Mas, tudo bem, talvez as pessoas tenham se assustado com a intimação, ou talvez seja simplesmente o mal da apatia, a única coisa que levo disso é jamais me calar quando alguém disser “o brasileiro é um povo acomodado”. Juro, que no auge da minha timidez doentia juntarei forças para dizer “que povo? Fale por você.” Pois eu a-pos-to que qualquer um que diga isso jamais participou de uma manifestação, sequer gastou um neurônio ou dois tentando organizar uma, e só repete esse senso comum sem refletir, como um papagaio.

A Polícia Rodoviária Federal se fez presente, representada por meia dúzia de indivíduos fardados. Nos questionamos o que eles faziam em uma rodovia estadual. Na verdade não questionamos, confirmamos que o interesse principal era a garantia dos lucros da ECOSUL, que está na outra rodovia, naquela que fomos limitados a protestar sem incomodar nadie. Pelo que pareceu eles queriam, a princípio, falar com o “líder” do movimento, que seria simplesmente a pessoa que mais “fez barulho”. Mas, acabaram conversando com todos.

O interessante do diálogo foi que... não sei como explicar. Parecia um teatro, só que com pessoas de verdade, o big brother, exatamente isso. Os policiais sustentaram um discurso de que vinham para que entrássemos em acordo, acontece que não existe essa possibilidade, digo em termos legais. Aí passaram para o discurso de que, eles queriam o mesmo que nós, e que precisava de educação, o problema era a falta de conscientização no trânsito, e eles vinham trabalhando nisso. Logo argumentamos, ainda mais diante do fiasco da ECOSUL, o problema estava muito claro.

Temos um problema estrutural. Essa estrada foi duplicada com o objetivo de esvaziar os pátios das montadoras e aumentar a produção. E se eles estavam lá, não era para fazerem acordos, ou garantir nossa segurança na manifestação (pois eles representam a esfera federal e estávamos em uma via estadual, reintero), era unicamente para nos oprimir em nome de uma empresa privada, que trabalha muito mal, diga-se de passagem. Mas, aparentemente nem eles haviam se dado conta disso, de que na realidade, naquele exato instante não estavam trabalhando para o governo federal, mas sim para uma empresa privada que lucra os tubos, valores que nem temos o direito de saber!

Mas, apesar dos pesares, isso é, mesmo tendo claro que o capital domina o estado, e que de público nesse mundo só banco de praça (com alguma ressalva), o encontro foi positivo! Concluímos que o melhor mesmo seria nos aliarmos à prefeitura, isso porque está mais próxima e aparentemente, como nós, tem buscado trabalhar em nome do bem estar público. Embora mesmo para a prefeitura não seja lá muito fácil, afinal como já dizia o pixador supracitado “só o capital é livre”.


Enfim, acertou-se que haverá uma reunião no IFRS na terça-feira às 14 horas, para elaboração de uma proposta de ciclovias na cidade, para ser levada na imperdível audiência pública de quinta. E que será proposto oficinas para a distribuição de refletores, afinal o objetivo máximo é que as pessoas possam ao menos não morrer atropeladas. Normalmente quem morre atropelado são pessoas mais simples, que foram marginalizadas e constrangidas a viver de maneira precária o bastante para não se indagarem quanto à necessidade do uso de refletores em bicicletas (que deveriam vir de fábrica). Aliás, percebi que 100% dos cidadãos que morrem atropelados se tornam alcoólatras, ou será que isso foi depois do incidente com o Thor Batista?

sábado, 8 de junho de 2013

opressão do capital

Estou simplesmente embasbacada! Ano passado, quando houve a morte de um ciclista na rodovia da minha cidade, essa um com uma quantidade absurda de mortes por atropelamento, eu participei de uma manifestação. Fechamos a estrada, com a presença suave da polícia rodoviária, e entregamos panfletos, informando a razão do nosso protesto. Alguns motoristas ficaram chateados, mas a maioria compreendeu. Acendemos velas, mentalizei uma prece. Penduramos a tenebrosa bicicleta-fantasma.

A partir de então passei a me envolver mais com o movimento. Entrei na página do facebook, e fui nas passeatas. Nessas passeatas não fechávamos de todo a pista, simplesmente nos reuníamos e pedalávamos por um trecho da estrada. Claro, o transito ficava lento, e alguns motorista buzinavam e reclamavam, são desses que tenho profunda pena. A maioria dos motoristas apoiavam, alguns não conseguiam entender que se tratava de um protesto.

Há três semanas morreu mais um ciclista, da minha idade. Foi atropelamento às 18hs de um dia extremamente frio, por um ônibus. A pancada foi tão forte que demoraram para achar o corpo. Fiquei sabendo que ele recém tinha comprado a bicicleta e usava para ir ao trabalho.

Nossa estrada não tem acostamento calçado, no trecho que aconteceu o acidente, não existe a possibilidade de trafegar fora da pista. É um absurdo. A estrada sempre (desde 2007 quando a conheci) foi usada por carroceiros, que não tem mais a possibilidade de andar nela. A duplicação foi feita claramente visando unica e exclusivamente (acrescentaria porcamente) aos carros. O ponto de ônibus é na verdade uma vaga, curta, e tem um telhadinho de alumínio. Não existem passarelas mesmo em trechos muito atravessados, existem no máximo faixas de pedestres e um sinal piscante (num bairro que muito cobra).

Quando propuseram fazer mais uma passeata e prender a bike-fantasma, eu questionei "mas, não tem adiantado nada isso", afinal, os motoristas que são os mais afetados já estão cientes do problema e não podem (ou sabem como) fazer muita coisa. Foi quando surgiu a ideia de nos juntarmos com o pessoal da outra rodovia, que corta essa e em média ceifa uma vida por mês, para fazermos um megaprotesto, começaríamos abrindo as catracas do pedágio, e depois fechando vários pontos das estradas e terminaríamos por pendurar a bike-fantasma. Beleza. Espalhamos cartazes pelo facebook e pela cidade.

Até que hoje, fiquei sabendo que a empresa de pedágio, ECOSUL, mandou uma intimação para os que ela julgava serem líderes do movimento, impedindo-os de realizar qualquer atividade na rodovia ou praça de pedágio, e inclusive responderiam por seus liderados, com um multa de 10.000 reais por cada líder, para cada infração!!!!

Acho que cabe um abre aspas para dizer que essa querida empresa prorrogou sua licitação por mais vinte anos de maneira ainda não muito clara...

Alguns dos membros deram razão à empresa, uma vez que estaríamos interferindo no patrimônio de terceiros, e que causaríamos transtorno aos motoristas e a liberdade de um termina quando começa a do outro. Imagino que o juiz que assinou essa intimação devesse estar preocupado com o livre fluir dos caminhões de soja que transitam nessa época do ano.

Bem, esse "patrimônio de terceiros" na minha opinião não merece o menor respeito. É uma estrada perigosa, que o estado está duplicando, e a empresa de pedágio só fica com o lucro. Quanto essa parada da liberdade que termina aqui ou ali, eu fico com a posição do sr Freire de que liberdade se constrói juntos.

Ainda assim, haverá manifestação, a princípio sem "ocupar o leito da rodovia". Uma manifestação dupla, implorando por segurança na estrada e opção de um método realmente público de locomoção, e repudiando qualquer forma de censura sobre um povo historicamente calado e nada participativo.

Esse caso nos diz muita coisa. Para começar a obra de duplicação, que ao explicitamente favorecer apenas automóveis aponta nossa submissão às montadoras, e descaso total com pessoas que não possam (ou queiram) usar carro, o ônibus é desagradável muitas vezes lotado, os pontos são totalmente desabrigados, atravessar a rodovia é um risco considerável, e não existe a menor possibilidade de se locomover com outro meio de transporte e esperar chegar vivo.
Outro ponto, a maior repercussão foi ter ameaçado parte do lucro de uma empresa privada. A qual, endossada pelo estado, basicamente proibiu e censurou a manifestação. Prevendo inclusive as multas (!)

Não sei se conseguem sentir tanta indignação quanto eu. Pessoas morrem CONSTANTEMENTE nessa rodovia. E as ações são sempre no sentido de aumentar o fluxo para caber mais carros. Justamente nesses tempos, que estamos exaustos de clamar por novas fontes de energia, novos padrões de consumo, ambientalmente sustentáveis e socialmente justos.

domingo, 2 de junho de 2013

Casca Grossa

Esses dias conversando com um amigo ele falou que foi tão estranho ver um catador de latinhas, ninguém sabia muito o que fazer, se olhava, se oferecia ajuda, se chamava a polícia... Isso porque Rio Grande é uma cidade pequena, que muito embora tenha (tido sempre) graves problemas sociais, mendicância não fazia parte de seu cenário urbano. Mas, agora é uma cidade "desenvolvida".
Nas metrópoles é comum ver mendigos dormindo nas ruas, crianças pedindo esmolas. E as pessoas acabam por se acostumar com isso. Eu não sei muito bem como funciona, eu penso que é tão doloroso encarar a realidade que o cérebro cria diversas formas de distanciar de nós esse sofrimento.
Em mau discurso religioso se torna motivo para que agradeças, “veja todos os pobres e desprovidos, e você, que tem tanto, tem que agradecer tudo o que tem”. Meio desagradável a gratidão baseada na desgraça alheia. Uma gratidão desesperada, movida pelo medo de se tornar pobre. Como se aquele tivesse sido ingrato, e por isso punido.
Então, o cidadão metropolitano segue trabalhando, agradecido. Aliás, foi devido ao trabalho duro que seus avós vindos da Europa conseguiram enriquecer. O trabalho dignifica e quem inventa qualquer desculpa para não trabalhar não passa de um preguiçoso encostado. Trabalhar e pagar imposto é a única coisa que faz de um homem importante. Tem esse senso comum de que os pobres são preguiçosos. Nem cogitam a possibilidade de que a pobreza seja “produto de processos sociais precisos de despossessão, disciplinamento e exploração, para a produção de bens e riquezas que são apropriados por outrem”*.
Afinal, mesmo que o trabalhador venha a sentir alguma compaixão por um mendigo, ele não teria tempo de ajudar. São muitos mendigos e ele tem um trabalho muito importante. Eu não sei, as vezes me sinto meio inútil no meu mestrado, penso que eu deveria fazer outra coisa, sabe, mas aí quando vou à São Paulo e converso com pessoas que tem um ar de importância fico desconcertada... Uma está num importantíssimo “case”, é de uma megaempresa que tem vários produtos em diversos países, e no caso da pasta de dentes as fábricas passaram a fabricar tampinhas diferentes em cada país. Então, ela está à semanas debatendo com um grupo um modo de padronizar as tampinhas de pasta de dentes. Imagino que a coordenadora do case deve ter viajado para diversos países e estudado suas tampinhas de pasta de dentes. É claro que quem tem algo tão importante para se preocupar não pode perder tempo com os milhares de mendigos que morrem de frio pelas ruas da cidade.
Eu acredito que talvez, inconscientemente, a impotência diante do atual cenário parece tão desesperador que passemos a engrossar nossa casca. A nos protegermos detrás de uma indiferença que nos distancia dos outros seres humanos e nos impede de sentir suas dores. Aparentemente essa é uma medida inteligente. Acontece que pelo que tenho visto não funciona. Uma hora ou outra estoura uma crise interna. Não tem para onde fugir, se fechar em si próprio não é a solução que vai resolver os problemas sociais, isso só agrava, o torna conivente com essa situação, e o pior nos distancia mais e mais da sonhada felicidade.
Tenho a sensação de que estamos sempre nos distraindo, com trabalho, com lazer, consumo, família, dramas pessoais e nos distanciando do que realmente importa.

*trecho do livro O que é Justiça Ambiental.