sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Mendigando nossa própria riqueza

Um artigo me chocou. Trata-se da gestão de uma Área de Proteção Ambiental nas Filipinas, mais especificamente em Apo Island. A área foi estipulada porque o coral estava em perigo e a pesca diminuindo, e então a comunidade local com auxilio inicial da universidade criou algumas regras para proteger o ecossistema, estipulou-se um comitê e a gestão era feita pela própria comunidade, o coral se recuperou e a pesca voltou a ser abundante, tornando esse modelo de gestão uma referência mundial. O que pode ser confirmado nesse e nesse vídeo. Até que, entrando na moda e obedecendo sugestão da ONU o país estabeleceu um Plano Nacional Integrado de Áreas Protegidas. E assim, a gestão dessas áreas passou a ser realizada pelo poder federal.

O processo aconteceu repentinamente sem o consenso da comunidade. Os poucos que "participaram" do processo não compreenderam muito bem, uma vez que esse foi feito em inglês e não no idioma local. Esse novo modelo de gestão desconsidera totalmente a opinião da população, prioriza o turismo e não realiza nenhuma melhoria social. Mas trouxe algo de bom! Gerou "emprego". "Women t-shirt sellers said that they had started selling t-shirts to supplement their husbands’decreasing incomes from fishing." (vendedoras de camiseta disseram que passaram a vender camiseta para complementar a queda do rendimento na pescaria de seus maridos). Uau, nada como crescer na vida, arranjar um job e poder vender camisetas, talvez possam até tomar coca-cola.

Antes o recurso usado para a gestão da área protegida era oriundo de doações dos ilhéus. Agora advém de taxas e multas, sendo portanto um valor consideravelmente maior! É uma pena que esse recurso tenha que ir primeiro ao governo federal, para depois teoricamente retornar a fração que cabe a ilha, 75%. O "teoricamente" não foi posto como figura de linguagem, o dinheiro demora meses para retornar e só depois de muita insistência o que causa uma estranha sensação nos ilhéus "the people of the island feel the agony of being slaves and beggar[s] of their own money and resources." (o povo da ilha sente a agonia de serem escravos e mendigos de seu próprio dinheiro e recurso).

Essa sensação estranha não é exclusividade deles. Eu peço que você assista a esse pesado documentário O Pesadelo de Darwin. É absurdamente triste e vai te dar vontade de vomitar, mas mostra tantas facetas de nossa sociedade que deve ser assistido, faça uma prece depois para a Tanzânia. Mostra como de alguma maneira surreal os africanos exportam todo seu recurso, inclusive o maldito peixe que é muito apreciado na europa, enquanto a população literalmente morre de fome e vive na miséria absoluta. A quantidade de peixe extraída seria suficiente para alimentar 2.000.000 de pessoas, mas é exportada em aviões que chegam vazios ou carregados de armas que sustentam as guerras mais sangrentas do mundo. A ONU, mais especificamente a FAO se preocupa muito com a questão, e em jornais e noticiários locais é dito que esta tem buscado auxílio, procurando juntar 17 mi dólares para fornecer ajuda humanitária. Uma vez que devido a falta de chuva a fome se agrava. Eu posso estar enganada, mas nessa troca (vender armas e comprar peixe barato para revender caro) a europa deve lucrar muito mais que 17 mi dólares e ainda ficar com um big fish.

E se você acha que mendigar pelo próprio recurso é algo exclusivo das Filipinas ou da Tanzânia, so sorry, mas temos o privilégio de estar na mesmíssima canoa furada. Esse videozinho é bem curtinho e ilustra um pouco o drama. 200 anos atrás os países mais ricos possuíam 3x mais riqueza, hoje são 80x mais ricos. Isso porque, apesar da gentileza com que eles oferecem um auxílio de 130 bilhões de dólares, suas multinacionais lucram mais de 900 bi dólares nas negociações esquisitas como o caso da perca do nilo, ou exploração de pré-sal, ou ainda com a realização de megaeventos como a copa. Sem esquecer que existe uma dívida a ser paga, o que transporta 600 bi dólares de países subdesenvolvidos aos "desenvolvidos". O que pode ser confirmado no Orçamento Geral da União, que destina 42% de seu montante para juros e amortização da dívida. Ademais, existe um lucro com a utilização de subempregos, ou de "escravos que mendigam seu próprio recurso".

Eu não pretendo nem de longe alimentar xenofobias, ou qualquer tensão entre "nórdicos" e "tupiniquins". Mesmo porque conversando e fuxicando no face eu sei que a coisa tão pouco está legal na Europa, muito embora longe de se aproximar do melhor dos sonhos dos africanos retratados no documentário, a saúde para a população tem deixado a desejar e cortes na educação vem sendo realizados. Porque também por lá uns oprimem aos demais.


quarta-feira, 23 de outubro de 2013

O cachorro mais sábio que o presidente.

Ah como eu amo cães! Eu sempre amei por amar, por gostar da companhia, de tocar o pelo, de não haver cobranças ou julgamento. Com meu namorado passei a reparar nos jeitos e manias dos animais, é meio que humanizá-los, mas é muito legal e filosófico.
Um dos cães que moram comigo usa algumas táticas para demonstrar suas necessidades. E desde que trocamos o pote de ração deles por um de metal, ele descobriu que lamber o pote vazio faz barulho pra caramba.

Assim, sempre que está com fome ele vai até o pote e começa a barulheira. Até que eu, ou o namorado, deixamos o que estamos fazendo e tomamos a decisão de atender a demanda do amigo. Inspirada nas manifestações costumo brincar que o Gurila agora protesta. Antes de pôr a ração eu afago sua orelha e digo "seu vândalo", em tom sarcástico.

Mas, e se eu não quisesse "obedecê-lo"? E se o barulho me incomodasse, se eu dissesse que essa ação dele é muito mau educada e radical, é uma violência. Se eu quisesse que ele protestasse de outra forma, de uma forma que não me atrapalhasse? Ele poderia muito bem se sentar pacificamente em frente o pote de ração e esperar por horas até o momento da alimentação!

Bem, nesse caso, toda vez que ele lambesse o pote eu iria até ele e xingaria, brigaria, gritaria, oprimiria, poderia prendê-lo no banheiro até que eu decidisse que era hora dele comer. Afinal eu tenho o poder de tomar essa decisão. E desse modo ele iria parar de fazer protesto barulhento, temendo a repressão.

Penso que isso se assemelha aos protestos e manifestações e como estes tem dividido sem razão a população. Tudo bem protestar, desde que seja de branco, com identificação, moças vestidas de saia bem comportada, cartazes com normas ABNT, limite sonoro, respeitando horário de silêncio. Depois que não adiantar, ai poderiam se dizer palavrões. E mesmo que não adiante, como não tem adiantado, como não houve resposta no caso do Instituto Royal, onde ativistas tentaram contato com a empresa, mandaram notícia pro ministério, fizeram manifestação pacífica, rezaram, choraram, empinaram pipa e nada, nenhuma posição da OSCIP (Organização da Sociedade Civil de INTERESSE PÚBLICO financiada pela FUNEP), nem assim se justifica a realização de "atentados terroristas".

Afinal arrancar olhos de cachorro para "pesquisa" tudo bem, mas invadir uma propriedade privada, estourar cadeados, isso não, jamais! Assinar contrato com empresas estrangeiras para entregar trilhões, enquanto pescadores que já não contam com acesso à saúde, educação, cultura podem ter sua atividade comprometida tudo bem, mas tombar carro, jamais! Sumir com pedreiro, uma vez que preto e pobre não faz diferença, tudo bem, mas tampar o rosto em protesto, jamais, cadê sua dignidade, rapaz?!

Os defensores de protestos pacíficos baseiam-se em Gandhi o entusiasta da não-violência. Bem, bem, para início de conversa, olha a Índia. Essa independência não foi assim "uma brastemp". E segundo que, enquanto Gandhi fazia suas admiráveis intervenções haviam protestos populares, não tão pacíficos assim. Porque, é claro, sobram motivos para revolta, eu fico impressionada é de alguém nunca querer quebrar nada, basta ler qualquer livro que traga um mínimo de crítica social para vc sentir vontade de explodir! Por favor leia, sobre justiça ambiental que é atual.

Uma pessoa que admiro muito falou "eles não podem quebrar as coisas, eu não sei qual é desses mascarados, se são pagos pelo governo, se são bandidos que desceram do morro, eu não sei". Como se houvesse algo muito misterioso no ar... eu levantei a lebre "não podem ser manifestantes, que simplesmente se cansaram de não ter resposta nunca, que sentiram a necessidade de ser mais "enfático"?" E aí Estado, não seria mais fácil servir a ração? Isso é se reestruturar para atender interesses sociais, invés de economicistas?

Acho que tem algo muito crucial a ser dito. Ouço pessoas criticarem "eco-terroristas", "feminazis", "ditadura gay", "talibikers" como se representantes desses ideais, que inevitavelmente cobram alguma mudança, fossem loucos, radicais, raivosos, mas será que não está havendo uma resistência muito grande ao "novo". Uma resistência radical, cega, que se agarra no seguro status quo, e critica qualquer medida real de mudança. Será que não é o momento de pensar "essa galera está tão raivosa a ponto de quebrar bancos, invadir institutos, ao ponto de enfiar imagens sacras no próprio cu, deve haver algo que os incomoda muito e que consequentemente deve ser mudado", ao invés de pensar "que vândalo maldito, destruindo tudo, deve ser escorraçado". Não seria melhor servir a ração invés de reprimir o pedido?

Fonte da notícia aqui.
Será que teremos que atear fogo ao próprio corpo (como protestam os monges), não para ser ouvido e ver alguma mudança, mas para pelo menos não haver críticas ao modo "violento" de se expressar, e em defesa à coisas e propriedade privada.

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Propriedade privada até quando?

Tenho lido "o homem é um ser histórico".
O que significa isso?

Significa que a decisão que você vai tomar daqui 10 minutos depende do seu passado, e o que lhe foi ensinado pelo passado do seu passado. Pela maneira como pensava sua avó e o que disso ficou impregnado no modo de pensar de sua mãe, e como foi e tem sido sua relação com ela e suas experiências de vida. Se você se mudou, se você se apaixonou, se você estudou, se você foi abusado ou oprimido, se foi humilhado ou amado na escola, se conheceu pessoas admiráveis, se cantou todas as canções do Legião Urbana, os livro que leu, essas variáveis influenciam em como você concebe o mundo e como você se encaixa nessa sua concepção de mundo.

Arte de "miniaturizar" cabeças humanas. Fonte aqui.
O meio influência em como você age. Existem diversos experimentos psicológicos que concluíram que humanos tendem a ignorar o que sabem para se adequar ao grupo (busque por Efeito Manada ou Experiência de Asch). Isso significa duas coisas, a primeira que se você for dar um rolê numa tribo africana que coleciona cabeças em miniaturas de humanos que eles caçam, e perguntar à alguém: "Você tem 5 cabeças humanas, não vê nada de errado nisso?" ele provavelmente vai lhe responder "Claro que sim, meu amigo tem 20!". Ou seja, se você está imerso num contexto onde colecionar cabeças faz parte da rotina, não verá problemas nisso. Por outro lado, se na sua cultura costuma julgar que pessoas que cortam a cabeça de outra são bárbaros (a não ser que esteja em guerra), então você vai julgar assim os que tem esse hábito e talvez deseje que sejam eliminados do mundo.

E então, vamos falar do vídeo da semana que dividiu opiniões. Eu não assisti e o pouco que sei foi de comentários do face e essa matéria do G1. Na verdade as opiniões não foram tão divididas assim, eu diria que aproximadamente 90% das pessoas se manifestaram a favor da ação do PM alegando que este deveria ser condecorado...

Bem, bem, bem... não é legal ser assaltado, não é legal ter uma arma apontada na cara, certamente a pessoa deve se sentir oprimida, assustada, violada etc. Quanto a isso eu não tenho dúvida, e nutro compaixão por quem é submetido a essa experiência.

Mas então vejamos, na matéria do G1 o bandido não estava roubando para comer, ele não iria vender, pois tratava-se de uma Hornet, ele iria apenas ostentar, o que "justificaria" ou amenizaria os tiros que tomou. E então o dono da Hornet optou por esse modelo porque? Para se locomover? Quando existem tantos outros mais econômicos... Ah, então quem trabalha e tem dinheiro pode querer ostentar... hum, interessante.

Segundo, se atuação policial ostensiva resolvesse a criminalidade certamente os índices estariam bem menores que os atuais. Basta ouvir qualquer música de RAP para notar que ação ostensiva policial vem barbarizando favelas e periferias à décadas, isso se tornou uma triste rotina. Se nos sentimos impotentes quando um bandido nos aponta uma arma, esse mesmo bandido se sentiu, não sei como ele pode ter se sentido, quando seu pai Amarildo não voltou mais para casa, por ter cometido o crime de ser preto e pobre.

Fonte aqui.
Existem dois mundos, baby. O meu, onde a polícia ilusoriamente protege. E o do Amarildo, onde a polícia destrói. E não precisa ir até o Rio de Janeiro. Sua cidade já tem pobre que sofre o bastante para lhe inspirar uma analise crítica... Papaguear que "bandido bom é bandido morto" é tão ridículo quanto, sei lá, não tem nada tão tristemente ridículo quanto isso.

Não consigo mais acreditar no conto da carochinha de que esse mundo é lindo cheio de oportunidades, que basta querer. Esse mundo "rede globo" que nunca esteve próximo a nenhum expropriado para ver que não é bem por ai que a banda toca. É interessante que pessoas que defendem a teoria de que o bandido é assim por ser um mau caráter, que não trabalha porque não quer, mas, no entanto põe seus filhos na melhor escola, compra brinquedos que estimulem o raciocínio, busca manter um clima de harmonia em casa porque leu e sabe que é fundamental para o desenvolvimento saudável de ser humano, paga centenas de reais numa escola de inglês. Porra, não fode!

Fica óbvio que as condições são absurdamente desiguais nesses 2 mundos, e querer que alguém que cresce num um bairro violento, que o estado só entra para matar, que estuda numa escola feia, fraca e sem recursos, assiste aqueles programas idiotas e totalmente distantes da sua realidade, que não vai ter fácil acesso a um livro e nem a algum local apropriado para lê-lo, que vive imerso em histórias de injustiça e abusos, querer que esse ser humano com esse histórico sorria e agradeça a oportunidade que você deu de ele recolher o coco do seu cachorro me faz ter nojo. Esse "bom comportamento" pregado pela mídia e religião, essa resignação que se tornou senso comum é humilhante, é muito mais lógico, digna e coerente a revolta "fuck you i won't do what you tell me".
Fonte aqui.

Eu particularmente, com meus princípios não me sinto confortável em pegar algo que não seja meu. Mas acho que cabe muito mais a reflexão sobre "a propriedade" do que sobre "o bandido". E nisso tenho que dizer que os protestos me fazem chorar de emoção. Ver os Black Blocs me dá vontade de enfiar uma camiseta preta na cabeça e sair correndo atuar! Eles me representam. Mas, a mídia não traz nem um relâmpago dessa reflexão. Ela simplesmente os trata como bárbaros loucos vindo do inferno... Como se fossem um bando de imbecis que gostam de ver coisas pegarem fogo, e que tem a intenção de comer crianças no jantar por sorte temos a polícia para nos proteger desses vândalos. Afe.

Mas, bem, voltando para o questionamento da propriedade privada e da atuação indecorosa dos bancos (que são alvos dos BB) gostaria de encerrar esse post com a minha mais nova esperança no mundo!

Vocês se lembram que eu havia dito que tinha 2 esperanças, no Anonymous, que bem, basta ver esses protestos ao redor do mundo para concordar que essa esperança não foi tão em vão assim, não é. E outra mais nacional era no partido Rede, que levou uma rasteira, o que significa que de fato trazia alguma ameaça ao status quo. Então, depois de elevar minha moral de palpiteira e de ter exposto um tiquinho mais a escrotice de nossa sociedade que ainda não é "civilizada" deixo uma dica de algo que merece um post especial:

Economia Baseada em Recurso.

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Respeitável público

O que pensar da prestação de serviço realizada pelos professores usando a universidade pública?

Eu nunca me preocupei em pensar sobre esse assunto. Afinal, me pareceria "picuinha" ficar me intrometendo na vida dos professores que eu tanto admiro. Cabe a mim julgar se o salário é suficiente? E afinal, existe a demanda por parte do empreendedor, existe o conhecimento do professor e existe o equipamento e espaço da universidade. Melhor para nós enquanto sociedade que esse trabalho seja feito por profissionais competentes do que por um picareta qualquer.

Pois bem, acontece que me formei. E ou eu me aventuro numa metrópole, ou azar o meu, o mercado de trabalho na minha área na amada Rio Grande não está fácil. Nesse momento passei a refletir no primeiro impacto de se ter professores prestando serviço de consultoria. Quem seria capaz de competir com a FURG? Que empresa pode competir com essa prestadora de serviço que não paga imposto, não paga salário, usa mão de obra qualificada de mestres e doutores pagos como bolsista sem carga tributária, não paga aluguel e tem modernos equipamentos?

E então, juntando o útil com o interessante, deixei a consultoria para os doutos e ingressei no mestrado. Fugindo um pouco da ciência dura, entrei num mestrado mais soft, e tive a oportunidade de aprender um pouco sobre a atual crise social, mais chamada de ambiental. Assim, fui formando um olhar mais crítico da sociedade, basicamente me assumindo com uma libertária de extrema-esquerda. E então meus amigos, quem se propõe a abrir os olhos é obrigado a ver muita dor e sofrimento. Nossa sociedade está doente e a universidade sorri como uma ilha de conhecimento científico formando um abismo entre si e o conhecimento popular a sua volta. E esse abismo é cúmplice na expropriação social.

Por isso toda universidade tem a política de promover ações de extensão. É só dar uma pesquisadinha onde relaciona extensão e universidade para ter acesso a informações lindas, como:

"políticas acadêmicas de extensão, comprometido com a transformação social para o pleno exercício da cidadania e o fortalecimento da democracia" (site RENEX)
ou
"um processo educativo, cultural e científico que articula o Ensino e a Pesquisa de forma indissociável e viabiliza a relação transformadora entre Universidade e Sociedade...
fluxo que promove a troca de saberes acadêmicos e populares, tendo como conseqüência a produção do conhecimento resultante do confronto com a realidade, a democratização do conhecimento acadêmico e a participação efetiva da comunidade na atuação da Universidade" (site da FURG, na aba extensão)

Assim fica claro a intensão e a necessidade da extensão. Que consiste em estudar, entender e propor melhorias à comunidade, que venha a se apropriar do conhecimento a ponto de caminharem rumo seu empoderamento e emancipação. E exige um retorno à sociedade.

Mas, não é o que costuma ocorrer em muitos projetos de extensão. Essa semana pude ler um que se constituía numa prestação de serviço à um empreendedor local, o Porto (SUPRG). E outros 2 denominados "projeto de pesquisa" o qual também se constitui numa prestação de serviço, à SUPRG e à Leal Santos.

Como eu disse, me recuso entrar no mérito de quanto os professores vão ganhar nesses projetos, pois isso de fato não me incomoda nenhum pouco. O problema é que na mesma reunião em que esses projetos foram aprovados discutia-se sobre uma disciplina que não tinha nenhum professor disponível para administrar. O problema é que é comum que professores não tenham tempo e energia suficiente de orientar alunos. O problema é que a sociedade segue a margem do conhecimento concentrado na universidade, tão perto e tão longe da Vila Maria.

Existem lindos projetos de extensão sendo realizados pela FURG, o NUDESE é um ótimo exemplo. Mas no caso da reunião que presenciei do IO como representante dos alunos do mestrado me senti decepcionada em ver todo o potencial de intervenção social que tem esse instituto resumido a prestações de serviço tão básicas. Como monitoramento e auditoria interna.

É consideravelmente diferente um projeto de pesquisa, onde o pesquisador com base em leituras e teorias busca um empreendimento para realizar um estudo, adquirindo um caráter inovador e visando o bem da comunidade, de uma prestação de serviço, quando esse empreendedor tem a necessidade de cumprir certas normas ambientais e procura o professor. O qual consequentemente, diminui seu esforço na pesquisa e ensino, para realizar esse trabalho (que poderia ser realizado pelos graduados e mestres que são constrangidos a trabalhar como bolsistas quando poderiam estar conquistando mais autonomia).

Resta saber se não existem empresas e laboratórios capazes de oferecer esse serviço na cidade porque a FURG monopolizou o mercado, ou se a FURG presta esse serviço porque não existe empresa do seu nível. E se, quem tem a faca e o queijo na mão está disposto abrir mão e assumir seu papel PÚBLICO. Outro detalhe é que existe na universidade a empresa júnior de consultoria ECOSERVICE, que é absolutamente desconsiderada por todos os professores que poderiam encaminhar à ela os trabalhos de consultoria que lhes são solicitados. Se os defensores da prestação de serviço pela universidade pública alegam que essa seria uma maneira de o estudantes terem contato com o mercado de trabalho creio que outros modos seriam mais adequados.

Segue abaixo breve descrição dos três "projetos" citados. E cabe o detalhe de que muitos "projetos" são picotados em valores menores. Pois valores que ultrapassam 1.000.000 são retidos e a burocracia aumenta. Mas, ainda não tenho nenhuma comprovação de que algum deles seja o caso.

2.1 – PE: Monitoramento do ciclo de dragagem no canal Miguel da Cunha e do canal de acesso ao Porto do Rio Grande
Relatório: O Diretor do Instituto emitiu carta de aprovação para o PE: Monitoramento do ciclo de
dragagem no canal Miguel da Cunha e do canal de acesso ao Porto do Rio Grande, de responsabilidade
da interessada. O projeto tem por objetivo o monitoramento da qualidade da água na área a ser dragada e ao longo do canal de acesso ao Porto, além de monitorar a geoquímica do sedimento e macroinvertebrados bentônicos, além de executar testes ecotoxicológicos. Além da interessada, que dispensará o total de 48 (quarenta e oito) ao projeto, participam também, os Profs.... Todos dispensarão o total de 96 (noventa e seis) horas ao projeto que está orçado em R$ 253.103,32 (duzentos e cinqüenta e três mil, cento e três reais e trinta e dois centavos), financiados pela SUPRG – Superintendência do Porto do Rio Grande. Teve início em OUT2013 e término previsto para ABR2014 e está cadastrado no SIGProj sob o número
162355.711.156046.18092013.

2.2 – PP: Auditoria ambiental e implementação do Sistema de Avaliação de Monitoramento do Desempenho da Gestão Ambiental portuária no Porto do Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brasil
Relatório: O Diretor do Instituto recebeu da interessada o PP: Auditoria ambiental e implementação do
Sistema de Avaliação de Monitoramento do Desempenho da Gestão Ambiental portuária no Porto do
Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brasil, de responsabilidade da interessada. O projeto tem por objetivo
realizar a auditoria ambiental de caráter interno no Porto Velho e Porto Novo e implementar um Sistema
de Avaliação e Monitoramento do Desempenho da Gestão Ambiental para área do porto organizado
do Rio Grande. Além da interessada, participam também as Profas.... Todas dispensarão 4 (quatro) horas semanais ao projeto, que está orçado em R$ 952.486,04 (novecentos e cinqüenta e dois mil, quatrocentos e oitenta e seis reais e quatro centavos), financiados pela SUPRG – Superintendência do Porto do Rio Grande. Os docentes serão remunerados pelo projeto que terá início em NOV2013 e término previsto para OUT2015.

2.3 – PP: O bonito listrado (Katsuwonus pelamis) e as condicionantes ambientais: Uma nova abordagem
Relatório: O Diretor do Instituto recebeu o PP: O bonito listrado (Katsuwonus pelamis) e as condicionantes ambientais: Uma nova abordagem, de responsabilidade do interessado. O projeto tem por objetivo a aquisição, interpretação e disponibilização de dados relativos à distribuição e abundância do bonito listrado (Katsuwonus pelamis) e de variáveis ambientais que condicionam os deslocamentos deste espécie no Atlântico Sul Ocidental e o monitoramento das operações de iscagem dos atuneiros com anchoita, no intuito de quantificar a demanda por isca, a disponibilidade e distribuição da frequência de comprimento das anchoitas em diferentes épocas do ano. Além do interessado, que disponibilizará 4 (quatro) horas semanais ao projeto, participam também, o Prof..., o Ocean.... e o Acad. ... O primeiro disponibilizará 4 (quatro) horas semanais ao projetos e os demais 6 (seis). Todos serão remunerados pelo projeto, que está orçado em R$ 312.000,00 (trezentos e doze mil reais), financiados por Indústrias Alimentícias Leal Santos Ltda. e terá início em OUT2013 e término previsto para SET2015. Está cadastrado na ProPesP sob o número 295.944/2013.

Proposta: Como os projetos têm financiamento externo, o Diretor propõe que o projeto seja homologado nesta reunião e que conste do plano de atividades do Instituto e dos participantes.

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Sai deste corpo que não te pertence

Não é nada fácil ser mulher nessa sociedade machista. Bom, não é nada fácil SER nessa sociedade, mas meu foco hoje é o pertencimento do meu próprio corpo. 

Seios
Eu não posso tirar a blusa em dia quente porque algum idiota resolveu sexualizar o meu seio. E então eu só posso mostrá-lo com o intuito de excitar um homem, qualquer uso além desse é reprovável por machistas. Até a amamentação pública é normalmente condenada (como bem colocado neste post da Lola), isso porque naturaliza o seio e rompe com o estigma sexualizado socialmente imposto.
Sou praticamente obrigada a usar sutiã para manter os seios atraentes sexualmente, conforme o padrão vigente. Tenros e empinados. Por mais que aperte, coce e possa estar associado a câncer de mama, o sutiã deve ser usado. Além do mais move uma indústria, aliás, o modelo atual tem patente americana...
O mais interessante é que os bicos devem ser cuidadosamente camuflados. Mesmo em biquínis, ao ponto de terem inventado uma merda de uma espuminha que fica molhada por dias, só para não corrermos o risco de mostrar que, diferentemente de uma Barbie, nosso seio tem bico. Bico de seio é vergonhoso e deve-se temer sua exposição. Eu não sei quem disse isso e tão pouco porque todos acataram, só sei que quando percebo que vou passar por isso sinto um desespero e tento alucinadamente disfarçar, me sinto realmente mal, como uma criminosa quando os bicos do meu seio ficam salientes. Não que eu ache exatamente feio ou ofensivo, mas é que é socialmente inaceitável.
E há uma rigorosidade na escolha do tamanho. Seios pequenos fogem do padrão exigido para despertar o desejo masculino. e como seios só existem para isso, devemos recorrer ao silicone ou (pasmem) sutiãs elétricos.
Sutiã dá choque para aumentar os seios


Roupas
Aqui a coisa fica realmente confusa e nebulosa para mim. Ao que tudo indica, devemos usar roupas curtas, como as modelos de revista, cantoras e atrizes de novela. Ouvi de uma senhora, que eu julgaria como conservadora de extrema-direita, a seguinte colocação "Você tem um corpo tão bonito, deveria aproveitar melhor ele, usar roupas mais curtas e decotadas. Com esse seu vestido fica parecendo uma crente".
Acontece que eu não me sinto lisonjeada quando meu interlocutor não consegue ouvir o que digo por estar contemplando meu decote. Eu me sinto invadida, ofendida, diminuída à objeto sexual, sinto raiva, me sinto oprimida e abusada. De acordo com os padrões sociais, eu não deveria me sentir assim, deveria me sentir poderosa, desejada. Mas não é o que acontece comigo.
O interessante é que quando a Nicole Bahls tem uma mão masculina enfiada contra a sua vontade entre suas pernas, ou quando alguém é estuprada, a culpa é da vadia que usava roupas tão provocantes... Eu realmente ainda não entendi se existe um limite que separa o decote perfeito do desejo e o decote que pede o abuso sexual.

Pelos
Não adianta, se você quer ser inserida na sociedade e ser respeitada, então você é obrigada a tirar seus pelos. Pelos femininos não devem existir, por mais que saibamos que eles existem. Não é uma opção deixá-los crescer. Se vc pensa que se depila só porque você quer, então deixe-os crescer ao menos uma vez, e vá a público. Não é vc quem decide o que fazer com seus pelos, amiga. 
Se homens podem decidir ter ou não barba, se existem homens com barba por fazer em cartazes sensuais de cinema o mesmo não ocorre conosco. Nesse curto documentário chamam a atenção de que sequer nas propagandas de depilação aparecem pelos!!!!
Pelos são censurados inclusive em propagandas de depilação
E esse é um detalhe tão inútil que é quase ridículo escrever sobre pelos. Mas, sim, nessa sociedade de imagem eles interferem em como você será vista e tratada. Vão cochichar, apontar, e comentar sobre seus pelos. Vão chegar ao ponto de criticar a Nanda Costa por não ter adotado a depilação da moda num ensaio fotográfico. E qual é a depilação da moda? Total, como criança, ou como a Barbie, não sei qual é desse fetiche. Se alguns alegam que é por higiene segundo um ginecologista (fonte): 

"Antigamente, depilava-se o corpo antes de uma cirurgia. Hoje, não se faz porque aumentam os focos de infecção na região depilada. Não há vantagens higiênicas. A depilação pode ser um fator de aceitação pessoal, mas não evita doenças. O pelo é um fator de proteção" 

Comportamento
Outra contradição, por mais que sejamos deliberadamente moldadas como objeto sexual não devemos fazer, muito menos gostar de sexo. Ainda que existam diversas revistas ensinando como se comportar na cama, como atender aos desejos masculinos, afinal é o que se espera de uma mulher, ao mesmo tempo existe a condenação das que fazem sexo. Como o caso da Fran, no qual o parceiro vazou um vídeo do ato sexual dos dois, e a garota foi terrivelmente ofendida pelos conservadores "tudo pela família" de plantão. 
Você tem a obrigação de fazer tudo na cama,
mas se souberem será chamada de vagabunda.
Se a sociedade tira padrões da cartola que limitam e causam sofrimento para todos, criança, animais, natureza, homens e mulheres, o padrões estipulados para as mulheres tem a função de servir aos desejos masculinos. Nos subjuga à objetos como se nosso passaporte para a existência dependesse de despertar o desejo sexual.
Corpo feminino sexualizado servindo como objeto de desejo.
Todas as imagens são ridículas, mas nas de cima temos a ilusão de que não são.
Me liberte e verás quem sou

Essa beleza artificial e forçada 
já não me impressiona mais. 
Quero pertencer a mim mesma.
Pare de me subjugar aos seus desejos
Me liberte dessa camisa de força.

Porque você não me escuta?
Porque você não me vê?
Eu existo e minha voz tem som,
independente de tudo.
Mas porque você só me vê 
quando visto salto alto?

Deixe-me livre 
e vamos falar do que realmente importa.
O meu corpo é tão somente
o que minha mente usa 
para se manifestar nesse mundo material.
Ele não sou eu.
Eu estou aqui, 
deixe de se concentrar no que você vê.
E então nos conheceremos.

Estou te esperando,
quando você chegar iremos conversar.
E você vai se surpreender
por tudo o que tem ignorado.
Você não vai mais ser você.
Vai ser tão livre quanto eu.

Quando você me libertar.