sexta-feira, 6 de outubro de 2023

Contradições no moribundo império "ocidental"

 Expandimos a compreensão, e quando ouço as análises geopolíticas percebo que se usa o termo "ocidente financeiro" que seria uma referência aos especuladores global, as corporações e suas instituições governantes, que exercem enorme influencia política, econômica e social. Já, então, me é claro que a atual organização de concentração de capital hegemônica é mais complexa do que a referência simplória que eu costumava fazer aos Estados Unidos. 

O país é ao mesmo tempo um propagandista da ideologia neoliberal e o aglutinador da força militar. O "ocidente financeiro" se apropriou do exército norte americano. Isso se exemplifica nos dados: das aproximadas 200 intervenções militares fora do país apenas ONZE foram aprovadas pelo congresso (wikimedia). Embora o Estado (mínimo e enfraquecido) não tenha o poder de decisão é ele que arca com os custos: de todo valor arrecadado em 2021 (1.6 trilhões de dólares) 53% foi destinado ao departamento de defesa (National Priorities Project). "defesa" de quem e contra o que (?). 

Esse recurso não chega nem perto de atender à população, as pessoas que moram naquele território. Para nós, brasileiras, que temos o SUS é impensável um hospital despejar uma pessoa debilitada para morrer de hipotermia numa temperatura de menos dois graus, porque ela não tem como pagar o tratamento! Anualmente a média registrada é de 50 mil mortes diretas por falta de atendimento médico, e haja visto o que foi o efeito da covid. Na skid row, a maior "cracolândia" do mundo uma população de cerca de 15 mil pessoas vivem entregues aos vícios em substâncias químicas cada vez mais potentes como o K9. Não há segurança para a populaçõa, em 2022 houveram 647 "mass shooting" registrados (Gun Violence Archive), cresce a quantidade de sequestro. Há uma queda na qualidade da educação básica em relação a outros países (Program for Internacional Student Assessment), e com o comércio de diplomas a qualidade do ensino superior massivamente diminuiu e o endividamento dos estudantes aumentou.

Neste mesmo país, há 7 dias atrás Mark Zukemberg deu sua primeira entrevista cuja imagem estava mediada (canal Lex Fridman). Uma live que junta as imagens instantaneamente (a criação dessas imagens usa tanto cálculo computacional para decodificar que possivelmente tornará todo o mundo real em máquinas específicas para esses cálculos). Isso (vídeos instantâneos feitos com uso de enorme quantidade de energia para games ou encontros que poderiam ser feitos na realidade existente) é fetichizado com o conceito de realidade virtual, "metaverso". Esse inteligente empresário protege os filhos do uso de tecnologia ao longo de toda infância para que possam se desenvolver organicamente, e cuida diligentemente da saúde de seu corpo, com alimentação e exercício físico, argumenta que o entretenimento (a distração) é resíduo do serviço, que tem seu mérito em conectar pessoas. Ele aparentemente confia que os indivíduos tem a capacidade de gestarem por si próprios o uso que farão das tecnologias. Como se não houvesse sociedade, cultura, história. E como se essa história não fosse de constante dominação e exploração pelos que concentram poder. 

Essa brutal desigualdade, na qual um punhado de gente se isola em mansões vigiadas e creem numa existência ultratecnológica que permite mergulhar numa "realidade" fictícia, outra gente sente na pele o aumento de violência, eventos climáticos extremos, a falta de assistência médica, a negação do acesso ao conhecimento, as mazelas do Estado mínimo. O que há nos EUA é uma crise humanitária, nascida da crença supremacista de "destino manifesto". Essa crença sustentou a dizimação dos apaches. É muito custoso pra uma psicologia saudável exterminar uma comunidade humana, essa justificativa delirante de estar a serviço de um desígnio divino tornou possível a expansão brutal das treze colônias, ampliando as fronteiras legais do território. A doutrina supremacista não foi superada e segue funcional ao acúmulo de poder e capital. Hoje esse "destino manifesto" está pintado sob o nome de "domínio do espectro total". Em documentos públicos podemos acessar que os EUA busca dominar o ambiente terrestre, marinho, espacial, subterrâneo (os minérios, petróleo), e segue tentando de todo custo (e custa muitos bilhões de dólares - Prashad) o domínio em outros "territórios", um campo de batalha bastante sensível: nossas mentes. Os desejos, os sonhos, os vínculos, as comunidades.

As atuais narrativas comerciais para vender tecnologia e colonizar o território da mente se apropriam de termos como realidade e inteligência. Dominam pelo léxico, distorcendo o significado das palavras. Se os empresários da tecnologia querem que as máquinas venham no futuro a desenvolver algum tipo de inteligência, isso está no campo do desejo, porque até hoje, via de regra, a inteligência é exclusiva de sistemas orgânicos, analisar e juntar dados, organizar informações em um tempo curtíssimo é uma função que nos poupa trabalho não material, mas não é inteligência (Nicolelis). A inteligência é nossa, é das pessoas que usam essas máquinas. Não somos e não devemos nos crer dominados por elas, e há que haver uma força organizada que faça frente a esse intento, há que haver regulação estatal. Que nossa tecnologia esteja à serviço da garantia das condições materiais que permitam a existência de ambiente saudável aos seres que aqui vivem.

quarta-feira, 19 de abril de 2023

Smells like teen spirit na indústria do entretenimento

 Histórica reunião, transmitida ao vivo, de ministros, governadores, presidente, prefeitos para debater esse inaceitável fenômeno de violência nas escolas. É de extrema importância que o tema seja amplamente debatido, e receba especial atenção do Estado. 

Estamos em um contexto de guerra híbrida, onde os Estados Unidos perde o domínio global das transações financeiras, a China (que tem um exército responsa) amplia e consolida relações em todos os continentes. Expandindo não apenas os fluxos comerciais como uma forma não impositiva e imperialista de relação exterior. Trilhões de reais serão investidos na rota da seda conforme as necessidades locais de desenvolvimento, e a exigência é que as obras de infraestrutura sejam viáveis e se mantenham economicamente, e que não cause impactos ambientais irreversíveis. A América Latina tem uma grande população, e tem minérios. As intervenções norte americanas na região tem sido constante e já nomeada e divulgada, historicamente, já entendemos ações de agentes da cia infiltrados nos Estados, implantação de ditaduras como no projeto Condor, espionagem, influência e manipulações em processos eleitorais... E é tático o controle cultural. A imposição do "sonho americano" como modelo, propagada em filmes, música e jogos. A hegemonização de um padrão de vida. 

Pois bem, o entretenimento, que tem dominado a "cultura", é uma poderosa indústria. E tem um fator de liberação de prazer, essa libido que tem sido tão dominada, talvez por isso quando na reunião, os parlamentares trouxeram a questão das telas, incitou ferozes críticas. Em muitas realidades, em que não se tem acesso à parques, à música, à locais que favoreçam as interações presenciais, a tela se torna a única fonte de prazer possível. E embora eu tenha tido muita dificuldade em encontrar artigos acadêmicos e científicos, alguns relatos me chegam, são vários casos, um rapaz jovem e bonito que por anos se isolou da sociedade e só jogava, um casal de psicólogos que relacionam alguns transtornos ao uso intensivo e precoce de games e telas, e usam o termo "vício". Imagino que os hormônios de prazer liberados sem nenhum esforço sejam altamente viciantes. Existe forte evidência, até intuitiva e pelo que conhecemos de corpo e pisque humana, a relação com doenças oftalmológicas, psicológicas (já li sobre correlações com suicídio infantil, automutilação, depressão, deficit de atenção, ansiedade). O uso prolongado tem indiscutivelmente um impacto na saúde do indivíduo e da sociedade. O dia 20 é emblemático pelo ocorrido em columbine, e os autores ficavam horas na tela e usavam jogo violento. Tem um entorno social que deve ser considerado, a ausência de vínculos diversificados, amorosos, atentos e presentes que pudessem inspirar esses jovens. Acontece que esse entrono, de laços sociais débeis, é produto dessa "cultura" imposta. 

Questionei a Inteligência Artificial sobre se jogos são usados como elementos de dominação cultural e guerra híbrida:




No domínio cultural, os jogos também podem ser usados para difundir ideologias e valores que favoreçam os objetivos das forças envolvidas. Isso pode ocorrer por meio de jogos que apresentam uma narrativa política ou histórica específica ou que se orientam para valores sociais ou culturais específicos. Além disso, os jogos também podem ser usados para refletir uma realidade ou visão do mundo que favoreça determinado grupo.

Em resumo, é possível utilizar jogos na guerra híbrida e no domínio cultural como uma ferramenta poderosa de manipulação e infiltração de valores e ideologias

Está aberto o debate. Os valores sociais não são "dados", são frutos de escolhas individuais, mas sobretudo política, econômica e social.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2023

Rascunho salvo

Quando tomei conhecimento dos chats de Inteligência Artificial foi num contexto de fazer tarefa escolar. Fiquei até muito contente. Os trabalhos de pesquisar e articular um texto poderiam ser feito por máquinas e nós poderíamos pensar, e ir além, teríamos o tempo livre para conviver com quem gostamos, desenvolver habilidades manuais, e articular os conhecimentos compilados pelo software com práticas transformadoras da realidade.

Muito bem, passado esse momento de genuína esperança com cérebro dopado da ocitocina que os saudáveis convívios propiciam. Fui eu utilizar o GPChat para um trabalho acadêmico, tudo ia bem, respostas concisas e elaboradas. Quis ir além, fazer perguntas que poderiam expor meus anseios de superação do sistema econômico. Parei, e perguntei se era possível rastrear meus dados. "Sim". Perguntei se essas informações poderiam ser usadas para perseguição política/ideológica:

Sim, é possível que a existência desses dados possa alimentar perseguições políticas ou ideológicas. A coleta, armazenamento e análise de grandes quantidades de dados pessoais vulneráveis pode oferecer insights e informações que podem ser usadas para controlar ou influenciar pessoas. Além disso, os dados podem ser usados para alimentar o preconceito ou discriminação em relação a certos grupos, ou para manipular ou suprimir a liberdade de expressão. É por isso que existem leis e regulamentos que regulam o uso de dados pessoais e asseguram que as informações não sejam usadas para fins mal-intencionados.

Meus cabelos se arrepiaram! De fato vivemos um enorme controle, há um perfil psicológico que indicam ações que poderíamos vir a ter, num cenário de "contra revolução preventiva" isso parece esmagador. Um perfil psicológico cirúrgico de cada usuário.

Quando meu filho era um bebê a professora me recomendou contar histórias. E me instruiu que não forçasse a voz, ou simulasse emoções. A carga emocional de uma narrativa densa ou alegre estaria de modo sincero na entonação da voz, quanto mais eu tivesse comprometida e conectada com o que estivesse falando. Isso se tornou uma máxima no meu modo de estar e me relacionar com os outros, expressar com o maior grau de sinceridade as emoções.

Por isso, quando o software me respondeu que "infelizmente" não poderia me passar o meu CPF eu fiquei gravemente preocupada. Ainda assim segui o que poderia ser uma conversa, e expus que um software não fica infeliz. Então me respondeu que os desenvolvedores simulam emoções para que a experiência seja "natural, personificada e humanizada", e que isso faria com que aumentasse a confiança no software. Num cenário em que 50 milhões de brasileiros sofrem algum tipo de doença mental (dados da Associação Brasileira de Psiquiatria) ter um software que dissimula emoções para ganhar confiança e gerar dados pode ser bastante perturbador.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2023

Pós verdade!

O recém democraticamente* eleito presidente Lula interrompe uma agenda que fazia em Araraquara devido desastres causados por chuvas intensas, algo que tem ocorrido com maior frequência e intensidade devido as mudanças climáticas. Ele interrompe porque "patriotas" invadiram o palácio da alvorada, em atos "instagramáveis" se assemelhando a uma incipiente "revolução colorida". E então decreta intervenção federal.

Essa notícia me atravessa a leitura de um fino livro chamado "Ninguém Regula a América", no qual os autores apontam as ferramentas táticas da Guerra Híbrida. Em especial as intervenções de gerar caos para desestabilizar não só governos como Estados. Ação de estudo, perfil psicológico com uso dos dados de redes sociais que mapeiam as fissuras da coesão social e atuam no sentido de dilacerar essa sociedade, e seguirem dominando.

O curioso é a distorção cognitiva. Em defesa de uma pátria (que nunca existiu, ou talvez tenha existido enquanto Pindorama...) atacam a pátria, em sua débil democracia. As vísceras nos estão tão impostas, que mesmo "nós" que lutamos por um arranjo social não imperialista, não colonialista nos vemos parte de um lado contra o outro, e projetamos esse outro lado nas pessoas, essas todas mais de 1500 que foram presas e gozamos essa prisão. Nós que já sabemos que apinhar pessoas entre paredes não traz lá o avanço que queremos. E sem perceber estamos lá ampliando o abismo social que separa nós - deles, o abismo que fragiliza governo e Estado. Abismo que gera ruídos nas construção e negociação de aprovação de propostas consistentes, dificulta a possibilidade do debate sobre a construção de um projeto de nação. De algo que nos tire desse lugar de bolinha de pinbal jogada de um lado a outro depois de um impulso mais ou menos consciente.  

Esse delicado momento de nos perceber imersos em uma guerra que nunca começou e nunca acabou, que em alguns momentos se materializa com armas e sangue, mas que agora está na mente de todos os cidadãos, conscientes dela ou não. Na barriga de muitos, no frio de tantos. 

* frágil e débil democracia, uma vez que houveram enormes entraves, desigualdade de recurso financeiro em campanha, a prisão política do Lula, o aparelhamento do Estado, o bloqueio de estradas.