sexta-feira, 16 de dezembro de 2022

O despertar enquanto morte

 Sonhos recentes me marcaram profundamente. Eu simplesmente inventei lugares e estive neles. Em várias noites, foram lugares diferentes. Muito lindos, algo que não existe. Algo que criei e fui com meu corpo, digo, a consciência do meu corpo. A sensação da água, a paisagem. Em um havia uma montanha de pedra com um buraco circular que a atravessava e por dentro desse buraco uma lagoa com água extremamente cristalina. Aconteceu ao longo de minha experiência acordada várias situações assim, alguém sabe de algum lugar e vamos juntos procurar e chegamos à uma paisagem fabulosa. São vivências que me impactaram e impactam profundamente. E talvez por isso levo a reconstrução de tais vivências para os sonhos. 

Acontece que o sonho não dura por quanto a gente quer. E nem existe um sair consciente dele. A gente não escolhe, não estipula. "Olha, às cinco precisamos ir embora que tenho compromisso". Não existe um processo de retorno. Recolher as coisas, por a roupa, calçar o tênis, esperar o ônibus. Não nada disso. A gente está lá, impressionada com a paisagem, e então BAM. Já não existe mais, nem paisagem, nem a sensação, a ideia do corpo no lugar. Nada mais. E o pior, um lugar único, que jamais poderemos voltar com exata precisão. Sem fotos. Ruptura tão drástica como a morte. Com a diferença que em casos de sorte trazemos a memória do que foi a criação inconsciente. Em outros casos nada, um absoluto vazio, como se a mente não tivesse elaborado qualquer criação inconsciente. Percebo curiosa que sonho mais quando passo o dia em água na natureza. Talvez por levar para o sono um corpo relaxado. Que não teme enquanto corpo o selvagem e a morte.


quarta-feira, 23 de novembro de 2022

Entre a raiva o medo e o escárnio

Uma enorme jamanta carrega um patriota agarrado em seu para-choque.
As sólidas instituições precisam avaliar e refutar ridículos relatórios "que não apontam, mas também não refutam falhas nas urnas", apenas as urnas que elegeram Lula, apenas no segundo turno.
Enquanto os neoliberais se aproveitam da situação para forçar suas pautas, alardeando que o mercado precisa ser carregado no colo e alimentado.
Mantém o circo armado, não tanto a ponto de derreter as instituições
Mesmo porque, essas instituições afinal os protege. Especialmente agora em que diante da crise ambiental e do dolar a China torna-se uma referência, a Rússia avança e mesmo por aqui a narrativa comunista está latente. 
Não tem jeito, estamos assistindo a mingua do projeto neoliberal, que tenta se manter.
Ou essa mingua será lenta e gradual, com a posse do governo democraticamente eleito, esse governo maneiro, representado por um estadista grandioso, que tem uma admirável habilidade de incluir e dialogar com tudo.
Ou será aguda. 
Enquanto isso vai se definindo, precisaremos ter estomago de assistir a galerinha desocupada e meio perdidona, a galerinha que não inclui a avaliação econômica e de classe nas suas práticas e seguiram com suas trapalhadas, penduradas em caminhão e com lanternas na cabeça a mandar sinais alienígenas. 

quarta-feira, 2 de novembro de 2022

Bandido bom e narrativa morta

 


Assistimos ao derretimento de uma narrativa delirante! A torcida organizada da gaviões da fiel desceu o morro e veio abrir as estradas, caminhões com medicamento e alimento já seguem seu rumo, para a PM entregaram as chaves das motos e pertences que alguns bolsonaristas desesperados deixaram para traz.

Aquela velha, velha estratégia de distorcer e criar fatos na tentativa de gerar ódio aos que defendem e lutam pelos interesses populares e sustentar falsos heróis está AGORA fracassando! Um grande fracasso do fascismo. O que é muito, muito melhor do que simplesmente ganhar uma eleição. A agudização das ações fascistas desesperadas expõe a verdade. E caso eles sigam insistindo e esperneando exporá ainda mais, ficará evidente quem está envolvido nas tramóias, chefe de Polícia Rodoviária Federal, juíz, capitalista... Usam o racismo, o ranço do ódio e medo anticomunista, chorume de um antiga campanha que se enraizou no imaginário de quem sonha ser opressor, usam isso para defender seus próprios interesses individuais, pequenos e mesquinhos. Pequeno e mesquinho como é o espírito deles. 

Num arroubo de jogarem o tudo ou nada podem perder tudo. O aparelhamento ideológico, é crescente o número de evangélicos que criticam, que se afastam dos cultos por perceberem a discrepância entre o discurso e o exemplo do Cristo revolucionário, o circo de nosso tempo, o futebol desce do morro organizado em defesa da democracia, a PM está rachada, não é composta exclusivamente de corruptos que defendem cegamente ao "capitão sujeira", a mídia abandonou o barco fascista (disfarçado de antipetismo), houveram denuncias de compra de votos com uso de programas de benefício social (evidenciando a importância de politizar os benecifiários). Estamos assistindo a ruína de uma longa e perversa estratégia de dominação. Que caia! 

E que caia e que morra a ideia antiga de dominar! Que fiquem as pessoas, humanas. Para ver o sol raiar.

quarta-feira, 26 de outubro de 2022

Quando não se tem nada a oferecer

 Hoje a notícia foi "a Mercedes saiu da Rússia". E eu gargalhei imaginando a duplinha EUA/Europa comendo junk food em carros luxuosos. Na foto o Putin escrevia algo sobre um capô e gostei de imaginar que fosse "beijo, tchau" assim bem debochado. 

A cada sanção fica nítido e evidente que o capitalismo ocidental tem pouco, muito pouco a oferecer. E atua numa lógica burra de punição. Foi assim com o gás, gente, para punir a Rússia a Alemanha ficou sem a possibilidade de fonte de energia. É como se nos fizessem crer que ter energia no território fosse uma lástima e não uma dádiva. Lembro um vídeo muito impactante da mulher falando as riquezas da África e que estariam muito dispostos à compartilhar, fonte de diamante tudo, mas a tática colonizadora européia foi depreciar, desestabilizar e saquear.  

A Mercedes, Mac Donald´s e qualquer corporação inútil dessa sair da Rússia é um favor que faz. E evidência como são frágeis essas corporações frente à uma nação. Elas se infiltram no governo, é monsanto usando ruralista pra fazer lobby no governo brasileiro, mas só trazem caos e não tem um poder real, porque o que elas vendem é falso e ilusório.

As nuvens se foram, finalmente o sol voltou a brilhar e ontem vi estrelas no céu!

quinta-feira, 20 de outubro de 2022

Cuida da sua vida

 E o que nos cabe além de cuidar da própria vida? A estrutura elementar, o princípio máximo de existência. Curioso como que um conselho tão importante é retratado em conversas de cenas televisivas e reproduzido num tom ofensivo. "vai cuidar da sua vida".

Pois aí que está o que há de mais sagrado e valoroso em nós. A vida. E que nos exige cuidado. Que nós, consciente e racionalmente cuidemos disso. Da vida que pulsa em nós. Como um primeiríssimo cuidado, que será estruturante para todo o demais. E nesse cuidado, identificando o que impede esse cuidado é que motivamos um engajamento político. Pra cuidar da minha vida é necessário ar puro, alimentação de verdade, moradia, e principalmente relações saudáveis. Que outros tenham tempo e tranquilidade para interagir. Que possamos nos ensinar, nos aprender, trocar dicas de cuidado para vida que pulsa para além do corpo individual.

o não corpo sem lugar sem vínculos

 Nasci sem identidade, sem comunidade, sem lugar, numa metrópole, filha de dois números. De números cujos ancestrais fugiram de perseguições políticas e miséria.

Às vezes sofro essas ausências, e sofro sobre maneira as ausências vindouras. Corpos humanos domesticados cuja única função é abrigar a mente que consome. Corpos que pouco se movem, que não toleram temperaturas, texturas, dores, emoções, sabores. Essa negação das necessidades dos corpos  aparece em conversas triviais, ela disse "ah, eu amei morar em Portugal, dá pra comprar tudo! Só comida e moradia que é caro, mas de resto: TV, celular, carro, roupas, bolsa, maquiagem."

E se eu sentia falta da comunidade agora poucos terão casa. A modernidade líquida da sociedade do espetáculo nos vende uma vida fake e maquiada em fotos de estética pasteurizada. E pílulas. Para artificialmente produzir um lapso de alegria para fotografar.

sábado, 3 de setembro de 2022

 São 18 horas de um domingo, nem frio, nem quente e eu acabo de protocolar o meu pedido de exoneração. Agora é assim, sem nenhum contato humano eu abro um site preencho e pronto. Exoneração do cargo de orientadora social da casa dos conselhos.

Desde a volta das férias que essa ideia voltou a estar absurdamente latente. Durante as férias passei cantando, passeando e contando histórias pra uma criança muito alegre e amorosa que eu tenho a honra de chamar de filho. Durante as férias eu soube da audiência pública sobre a criação da escola cívico militar. Não houve consulta nem diálogo ao conselho municipal de educação. 

Já avisei toda a equipe, que foram extremamente atenciosos e acolhedores. Eu avisei do meu estado, mas ainda não tinha feito o pedido. Preferia que houvesse a possibilidade de haver alguma outra pessoa que ficasse no meu lugar. 

E então houve um outro absurdo ainda mais grave, um decreto cancelando a reserva de Castelhanos foi aprovado na câmara municipal. Novamente sem consulta alguma ao conselho municipal das comunidades tradicionais. E então o que é isso? Que a gente gosta de chamar de democracia? De organização social? É um delírio coletivo?

terça-feira, 30 de agosto de 2022

A luta de nós todos

Sonhei que estava submersa. Afundando. Como aquele instante em que o impulso do pulo nos afunda enquanto o empuxo se contrapõe e sabemos que inevitavelmente voltaremos a superfície. No sonho esse instante se demorava. Pois o sonho iniciou, ou a consciência do sonho começou exatamente dentro da água. Não no alto observando a superfície da água, calculando a hora e o modo de me atirar. Não. Foi de baixo d'água, e enquanto estava lá, eu pensei que para estar afundando a tanto tempo deveria ter pulado de muito alto, e me perguntei como tive coragem. 

Estamos submersos e uma força grande e desconhecida nos faz afundar quando o natural seria o empuxo nos levar para superfície. Ouvi o termo "contra-revolução preventiva". O mínimo esboço de avanço é combatido de formas diversas com uma força imensa. Como os bebês de berçário que param de chorar por não serem atendidos, um estado apático cresce conforme mais consciência da amplidão da biopolítica, do agravamento e das possibilidades remotas de superação.

De ante mão já sabemos que não adianta. Já sabemos as limitações e as repressões, às vezes nos surpreendem por serem mais brutas e mais drásticas do que calculávamos. E então é isso, pra cada ação, por mais insignificante, reações. Mais bárbaras quanto maior a consciência de quem pratica. E a racionalidade ao contrário de nos fazer avançar, nos prostra, mais e mais. 

Pode assistir televisão, jogar video-game e comer da indústria, usando remédios para domesticar o corpo rebelde. Quem não pode assistir televisão, porque não é branco o bastante, pode querer assistir televisão, pode querer um celular melhor, com internet e joguinhos. É isso que o sistema capitalista tem a oferecer, distrações pasteurizadas, corpos inertes, mentes letárgicas. Esse é o fluxo hegemônico da inercia que a tudo arrasta. Para viver o não isso é preciso enorme esforço, buscar e fazer acontecer, com pouco espaço, nulos recursos, e atenção, muita atenção com a linha. Além de desapego com os resultados. Os problemas que enfrentamos são enormes, mudança climática, déficit hídrico e energético. 80% da energia usada nos EUA vão para o departamento de defesa, uma hora de voo de um caça emite tanto gás de efeito estufa quanto 30 anos de um carro popular. O que nos liberta de exercer ações coercitivas entre nós. Cancelar o colega que tem uma banheira... O "fazer a sua parte" toma uma outra dimensão. Uma vez que nossas ações individuais não terão um impacto real na macro política estamos libertos do fazer com essa obrigação. Nós podemos fazer por, com prazer! Esse prazer em desfrutar das relações humanas, com que está do nosso lado, materialmente. 

Eu não estava embaixo d'água. Eu estava sonhando que estava embaixo d'água, e segurava minha respiração. Quer dizer, meu corpo segurava a respiração e foi meu corpo indômito que tomou o ar, e no sonho eu respirei embaixo d'água. Ainda tinha medo de me afogar, por isso respirei bem pouquinho, pensando estar sorvendo a porção de oxigênio dissolvida e com esse pouquinho de ar parei de esperar pelo empuxo e fui nadando para superfície, onde poderia respirar todo o ar que meus pulmões são capazes de sorver.

A gente só precisa de vencer uma vez. A vitória é absoluta. Os fracassos, por serem pontuais e temporários serão muitos. 


sexta-feira, 15 de julho de 2022

Abençoada é a memória do filho de todos

Muitas mentes criam um sonho. Como um vaso de cerâmica feito por muitas mãos. E também os sonhos se quebram. Os pedaços não podem ser varridos e descartados. Eles pairam nesse espaço, “não espaço” de nossa nuvem psíquica. Como satélites inutilizados que orbitam a exosfera. Só que os pedaços de sonho são tão preciosos, se relacionam entre si, tem memória. As exosferas das psiques se juntam, e os sonhos orbitam de uma para outra.

Quando eu menos esperava me deparei com o mesmo sonho, velho, antigo, quebrado, ali, a mesma forma, completa, pairando no meu “não espaço”. Ainda é tão lindo, mesmo com tantas rachaduras. A mesma forma. Com a diferença que não era uma peça só, os cacos não estavam fixos, apenas juntos. Achei que jamais assumiriam a mesma forma. Mas, lá estavam eles,  pedaços de um mesmo sonho unidos pela memória do que foram.

A surpresa me paralisa, não tenho reação, só olho. E choro. Eu não sei. Não sei se gosto, não sei se preferia não ter participado da criação desse sonho. É tão bonito. Não tenho a cola capaz de fixar esses cacos. Se tivesse uma brilhante, que não escondesse a junta. Eles vão se separar. Me resta confiar nos cacos, em como eles sabem dançar pelas psiques, se exibir para as que os reconhecem. Quero perceber cada movimento. Quem sabe se juntem em outra forma. E possamos aparar as arestas, construir novos pedaços, encaixes. Gostaria de não estar só.

Por ora vou mesmo sentir o preenchimento que o sonho traz. A forma, a rachadura, o afiado das pontas quebradas. A beleza do encaixe perfeito, a diversidade dos cacos.  




quarta-feira, 22 de junho de 2022

Força militar em Ilhabela

Algo que nos contentamos sobremaneira da vida na Ilhabela é a segurança. A sensação de segurança. Saio a qualquer hora da noite com a plena certeza que voltarei para casa. Adolescentes saem para paquerar e crianças vão sozinhas de bicicleta à escola.

Entretanto, com o efeito da pandemia o contingente populacional aumentou sem um mínimo preparo estrutural. Serviço de internet, tratamento de esgoto, ampliação de ciclovia, de leitos no hospital, quadro de funcionários, vagas em escolas são os mesmos para a população que pode ter aumentado um terço. 

E como se fosse impossível escapar da "metropolização" assistimos atônitos o aumento da violência policial. Vazou um vídeo de uma abordagem policial desnecessariamente agressiva com um cidadão. E em paralelo o meio de comunicação publica imagens de pessoas detidas incitando comentários de ódio e de admiração aos policiais militares nas mídias sociais.

Acontece que não há heróis. Especialmente quando estamos imersos num limbo, que normaliza a violência, o ódio, o medo e as violações. Já sabemos as mazelas das metrópoles, das quais fogem os que aqui vem, em busca de se aproximar do bem viver. A polícia militar brasileira é a que mais mata, e também a que mais morre, inclusive por suicídio, dado o estresse da atividade a condição do trabalho, não há heroísmo nenhum. A lógica militar é criada para ser usada num sistema de guerra, onde há um (suposto) inimigo que deve ser brutalmente eliminado. 

Como é possível que essa seja a melhor lógica para conduzir a educação de crianças? Se sustenta no frágil argumento sobre a "qualidade" das poucas escolas militares que existem. Desconsiderando os INUMERAVEIS modelos de sucesso educacional ao redor do mundo. Existe escola sem aula onde os estudantes são guiados pelo prazer ao conhecimento, e assim desenvolvem coletivamente suas consciências, com respeito e apreço à vida, construindo relações humanas saudáveis e de confiança.

Eu sou filha de militares, e acho fofo, é dizer, eu entendo o orgulho que meus pais sentem em se perceber parte de uma corporação. É o desejo de pertencimento à um coletivo, que irá te amparar, apoiar e compreender, algo que faz sentir orgulho de si. Só que esse "clubinho" boia sobre uma lastimável piscina de sangue. Que sem dúvida alguma não precisa existir e pode muito bem ser evitada com outras políticas.

terça-feira, 14 de junho de 2022

A mulher branca como sustentáculo ao sistema de opressão e acumulação

Em um programa de TV chamado “É de casa” a mulher branca entrega um tabuleiro de cocada para única mulher preta do lugar com a ordem “agora você vai servir todo mundo”, senta-se para esperar e após der servida retribui com um abraço supostamente carinhoso, como reforço positivo. A equipe bolsonarista aposta na bela Michelle como propaganda eleitoral. Enquanto a Faria Lima tenta emplacar a candidatura de Simone Tebet como uma “nova” forma de manter vigente o sistema de acumulação.

As mulheres brancas, usadas como modelo hegemônico de existência, dedicam toda sua libido na manutenção da coesão familiar. Algo que é intrinsecamente prazeroso e instintivo torna-se um papel social limitado e eterno: “mãe”. Esse papel social nos seduz, e nos confunde, porque enquanto seres sociais que somos queremos e precisamos de afeto, carentes de carinho, atenção, alguém que nos veja, que acompanhe a dinâmica da vida, nos sentir parte do bando, buscamos que as crianças tenham referências para além de nós e nossos vícios, para que se constituam adultos capazes de lidar com maiores complexidades. Crendo na impossibilidade de viver momentos de respeitosa intimidade fora de um casamento investimos tudo na coesão familiar, o trabalho passa a ser um apêndice dessa vida, é incrementar renda, trazer assunto, servir de exemplo pra filho, e quem sabe botar respeito. A descrição da já citada pré-candidata neoliberal começa com “Mãe”.

Estamos assim, servindo de sustentáculo à um seleto grupo de capitalistas que acumulam. Dentro desse sistema a família não tem outra função que não essa. Por mais que sejam verdadeiramente constituídas pelo amor recíproco haverá esse pano de fundo. O problema não é a família em si. Vem de dentro do nosso útero esse querer profundo de estar próximo, de gestar, parir e manter uma parceria, se acarinhar, cochichar, admirar e ser admirada, desejada. Mas que dentro dum sistema de opressão há a apropriação desse arranjo, o despojando de sua autenticidade. Tornando o arranjo artificial e protocolar a ponto de sempre haver dúvida. O convívio compulsório deixa de ter base no prazer e se torna coercitivo, é corrompido.

A menor das questões é sexo ou a manutenção ou não do arranjo social em família. Tanto faz se transa ou não, como, com quem, se tem gênero, tanto faz se casou, separou, se tá aberta ou fechada a relação, se ele ficou com outra depois de te jurar amor. Isso pode doer na hora, mas é pequeno, a gente supera. A questão, manas, é atentarmos à não manter e reproduzir os adoecidos valores que sustentam o regime de acumulação capitalista. Sabendo que estamos há séculos sujeitas à um sistema que nos despoja, e que nesse sistema além de espectadora do espectador somos também um sustentáculo em nossas micro-ações, rompamos!

Atentas à como conduzir nossas relações afetivas, cientes que são relações sociais, para além da nossa satisfação individual imediata e egóica.

segunda-feira, 13 de junho de 2022

O banquinho e o medo da tecnologia.

"Matematicamente a probabilidade de estarmos em uma simulação é maior do que a de não estarmos" ouvi em uma das publicações de instagran e houveram tantos gatilhos disparados que me afastei. É um medo antigo esse meu, ou esse nosso. Desde operários à quebrar máquinas. Agora a gente sabe, é fácil, é bom controlar máquinas que nos substituem o trabalho físico. Eu sinto prazer em usar a lixadeira de bancada e fazer em 1 minuto o que faria em horas com as mãos. E que as vezes lixo com as mãos pra sentir o ritmo, a pressão nos dedos. Só que com a inteligência artificial as máquinas poderão pensar. E quem sabe sentir, como a LaMDA alega sentir. Como nessas assustadoras distopias, Matrix, 1984, Admirável Mundo Novo, Black Mirror, Elysium.

Isso costumava me assustar profundamente. Especialmente porque me senti durante muitos anos preterida por video-games num relacionamento afetivo insatisfatório. High tech, low touch.

O que nos identifica enquanto humanos. A teleologia é a capacidade de planejar e executar. Diferente de uma abelha que constrói a colmeia de modo mecânico, instintivo. Sempre igual, com o mesmo desenho, material e propósito. Nós, seres humanos temos isso pulsando naturalmente em nós, a capacidade (e a necessidade) de criar, modificar, elaborar. 

Na pequena oficina municipal, meu celular fica esquecido na mochila, e eu procuro, hoje encontrei uma madeira roxa para enfeitar o banquinho (especial pra quem gosta de uma sentadona). Num ambiente de sororidade, vamos entre mulheres trabalhando os materiais até dar a forma que queremos. Esse fluir da condição humana é fundamental pra sanidade, estamos privados de viver isso. Os empregos são mecânicos, e nossos utensílios tem o trabalho humano todo fragmentado.  

Eu uso a tecnologia, saí correndo pra escrever no computador, a caixinha de som está ligada, ouço notícias e uso o tinder quando me sinto disposta a conhecer alguém para uma finalidade específica e pouco burocrática. A tecnologia inteligente me serve. 

Um desses dias em que passava pela guarita do parque reclamei com meu amigo, sobre como estão cerceando minha liberdade. Ele me criticou por eu estar impondo minha liberdade individual sobre a política de Estado. Bem, de início, tem algo que o colonizador não alcança, é a integridade com o território, em meu corpo eu vivencio a montanha, eu preciso andar pela mata, as águas que correm são como meu sangue, sinto a poluição de um rio no meu corpo. É também o cheiro, a estética, e é o imaginário. Além do mais, eu temo que privatizem, que terceirizem e algum salafrário venha lucrar por cima de mais essa necessidade vital. O que começa aos poucos, sempre aos poucos, primeiro uma guarita supostamente para cuidar minha integridade física, já me tolhem os horários desconsiderando a minha capacidade de trilhar a noite, de apreciar o por do sol, o nascer da lua, anotam meus dados, a frequência, o cálculo de mercado. Então entendemos que preciso de liberdade para existência, e não na existência. E que não confiamos nesse Estado burguês. 

A questão seria como por a tecnologia à nos servir, e não à servir a acumulação de capital, que depende de nos submeter à consumidores, estritamente.

quinta-feira, 14 de abril de 2022

Cinco dias

 Ele demorou cinco dias para morrer. 

Antes disso demonstrava sinais de fraqueza, já não controlava as excreções, o cheiro forte de xixi impregnava. As patas traseiras já não estavam ágeis, e aconteceu de ficar deitado por algumas horas no próprio xixi. A velhice, a fraqueza e a aproximação da morte causa muito incomodo, alguns amigos me sugeriram acelerar o processo, usar um atalho e acabar com o sofrimento. Ele parecia perdido, imerso nos próprios pensamentos, ou na falta deles. Eu não tinha certeza se ele sofria. Éramos nós, humanos olhando a fragilidade à que a natureza nos submete, nós sofremos com a certeza de que a vida, o instante entre o nascer e morrer, é um empréstimo. A natureza nos empresta esse tanto de vida por um tanto de tempo, e depois toma de volta.

O cachorro, filho do Sid, meu primeiro cachorro, entrou na minha vida por acaso, não por escolha, mas tão pouco a contra gosto. Ele seria do meu sogro, mas a ex-esposa o julgou incapaz de cuidar e não quis dar, o meu então namorado o pegou por considerar que ficaria mais feliz no lugar onde morávamos, com espaço, acesso à natureza e a companhia do irmão Gurila. O namoro acabou, de modo que coube inteiramente a mim saber como conduzir o cuidado.

Eu não gostava de vê-lo fraco, eu não gostava do cheiro de urina, nem de limpar o coco. Para lhe cortar as unhas eu precisava segurar com força as patinhas, e tinha receio de lhe machucar. Em dias de sol lhe dava banho. E preparava marmitas semanais de carne fresca. Toda manhã ele ia pra cozinha esperando por esse momento, e eu o levava pro gramado. 

Na terça-feira ele não veio. E eu o encontrei entre os pés de mamão, preso por pernas que não mais obedeciam. Meu filho me ligou, e falávamos por vídeo, o Jacques ficou com a carne na boca, e só engoliu depois que o Gabriel disse "vai Jacques, come a carninha". E então, ele não comeu mais nada, nem bebeu água, nem se levantou. Eu saí pra trabalhar, mas as lágrimas me corriam, elas brotavam incessantemente, uma enxurrada. A única coisa que eu queria era ficar ao lado dele. Meu camarada me abraçou e me disse pra faltar ao trabalho. Minha amiga me abraçou, me preparou comida. Eu estava triste. Sinto saudade do meu filho. 

O cachorro respirava. Lhe dei água em uma colher, ele sorveu. Passei a noite pensando que ele morreria em qualquer momento, eu queria tanto estar junto dele nesse momento. Eu não queria encontrar o corpo morto. Era sempre desafiador direcionar meu olhar pra ele. E quando via o movimento do ar o suspense continuava. Eu estava ansiosa, comprei pá com o cachorro ainda vivo. Eu teria que estar forte para enterrá-lo. 

Não gostei de estar ansiosa, eu precisaria me libertar da ansiedade pra me conectar com os sentimentos que me preenchiam a alma. Fui trabalhar na quarta. Mandei mensagem pro ex-namorado, dizendo que o cachorro simplesmente não conseguia morrer, pedi que ele viesse com nosso filho, ele não veio. Levei o cachorro no riozinho que costumávamos ir, eu brincava de ninja com o Gabriel sobre as pedras e o cachorro se abaixava na água pra refrescar a barriguinha. Nesse dia ele não esboçou nenhuma reação, era por mim. Entendi que grande parte da minha tristeza vinha de reconhecer que já não haveria a família que havíamos vivido. Esse desejo já tão inconsciente seria enterrado junto com ele. O lapso de esperança de uma reconciliação, estava sumindo como a massa muscular do cachorro, me senti só. A vida está no viço dos músculos, no brilho dos olhos, e vai saindo aos poucos. Se desfazendo no ar. Minha amiga nos acompanhou, contente em descobrir um novo lugar. Eu estava acompanhada. De noite companheiros chegaram, confraternizamos um jantar, jogamos bilhar, eu dormi, acordei e o cachorro ainda respirava. 

Eu lhe carreguei no colo, embalei suavemente, minha respiração estava travada. O soltei, e deitei-me junto do companheiro que pode sentir um pouquinho do meu pesar, ele não disse uma palavra, me acariciou suavemente os cabelos. Meu filho me ligou e eu disse que o cachorro estava ainda mais fraco. Ele desligou e meu camarada chegou, me preparou um suco verde. Ficou evidente que eu não estava só. Mesmo sem família por perto o que eu sentia não era solidão. Era tristeza. Morrer é um processo difícil. Amar é fácil, se não é fácil, leve, gostoso, prazeroso não é amor. Soltar toda essa integridade que concentra um punhado de vida, isso não é fácil.

Estendi meu saco de dormir próximo ao cachorro, acendi uma vela. Li uns trechos do Livro Tibetano dos Mortos, sem lá muito sentido, exceto pelo fato de falar sobre os olhos. Então, era assim mesmo, toda a humanidade que acompanhou o processo natural de morte, ao longo de séculos, me trouxe uma certa normalidade. Passamos a noite no sereno.

Na sexta, quando voltei do trabalho ele ainda respirava, e estava molhado de xixi, lhe preparei um banho morno de camomila e macela, numa bacia tão grande que o corpo flutuava, ornamentado pelas florzinhas delicadas. Um casal de amigos esteve conosco, ela com pesar, ele me assegurando a serenidade do cachorro. Choveu, viemos pra dentro. Essa foi a noite mais difícil, ele tentava latir, tentava se erguer e caia com a cabeça no chão, eu lhe contive com força, e pensei que talvez tivesse errado, que deveria ter poupado. Eu o sustentava quando ele tentava levantar, o apoiava o máximo que minha força e paciência permitia, e então o deixava tombar suavemente cansado, até que ele se agoniava e de novo eu lhe sustentava o peso. Em algum desses intervalos consegui dormir, e quando acordei não o encontrei. Fui no jardim, ele não estava. Ele havia passado por uma fresta de dez centímetros e se aninhado debaixo do sofá. Uma toquinha escura. Lá passou o sábado, apenas incomodado para que eu lhe desse água até que não quisesse mais. Essa noite, do sábado, o deixei e dormi no meu quarto.

No domingo pela manhã recebi muito amor de quem me acompanhou por todo processo. Meu filho me ligou, lhe mostrei o Jacques na toquinha. E preparei mais um banho de camomila com macela, ouvíamos incessantemente Leyfðu ljósinu. O pus na água morna, ele engasgou, a respiração parou discretamente, seu coração bateu em minha mão, até parar. E assim, já não havia mais vida. E eu estive com o Jacques em seu último momento. Não há mais sua presença, nem seu pelo macio.








quinta-feira, 7 de abril de 2022

Sou uma mas não sou só

 Meu cachorro está morrendo e com ele a ideia do que foi a minha possibilidade de família. A saudade, de acreditar nessa ideia, me faz criar um tempo em que havíamos nós. Como se tivesse havido concretamente um “nós três” no qual eu não me sentisse só, a implorar por migalhas de amor, carinho e atenção.

Sou uma, mas não sou só.

Meu cachorro de 16 anos morre lentamente. Começou cambaleando, a vida parava de visitar os membros inferiores, e não havia mais controle das excreções. Até que ontem ele parou definitivamente de andar, e já não conseguia comer nem beber água. Eu o banhei no rio. E ele passou todo o dia respirando. Enquanto minha ilusão sobre o trio familiar se desfaz, tão lenta quanto a morte do cachorro.

Não que eu queira me desfazer dessa crença, como não quero que o cachorro morra. Mas, a vida calmamente vai deixando o corpo dele, ele está sublimando, consumindo-se, sumindo. A se diluir no ar.

Gostaria que os três pudessem se juntar, pra nos despedir do cachorro e também da ideia de “nós três”.

Por um momento pensei que pudesse estar sentindo solidão. Se não sou trio estou só. Mas recebi abraço. De companheira e companheiros. Me alimentaram. Sem drama, sem lágrimas, sem gravidade, assim, leve. Sinto os pelos macios do monstro da solidão, amansado. A concepção da existência em três vai se esvaindo, sublimando como os músculos do cachorro. E o espaço que deixa não é vazio, embora amplo é iluminado e arejado. Preenchido de abraços, carinho, cafunés, olhos, mãos, toques afetuosos e não compulsórios.

Somos um, sou uma mas não sou só.

sexta-feira, 18 de março de 2022

Cinturão de Vênus (Ctenóforo)



O desejo de estar no mar. Para me saber acolhida, envolvida. Montei na bicicleta e fui, só. Era noite, me despi num cantinho escuro e me atirei na água. Algo gelatinoso roçou na minha perna, e mais outro. Não me machucava. Pensei que fosse plástico, mas quando tirei da água se desfez. Quatro dias depois, sob sol forte fui novamente. Dessa vez pude ver, o reflexo colorido, tão delicado. Haviam muitos, se enroscavam me acarinhando a perna. Uns pequenos peixinhos vez ou outra me beliscavam o pé. Nosso resquício de vida marinha.

Muitos anos atrás, numa sala fechada, com luz artificial estudávamos os inimeráveis compostos químicos despejados nos oceanos. E a morte que carregam em si. São toneladas de shampoo, fertilizantes, remédios, os compostos reagem e enquanto alguns cientistas buscam conhecer o efeito dessas complexas interações no funcionamento da vida, como alterações hormonais que interferem na reprodução, novos produtos são liberados no mercado, para que os cabelos fiquem "5 vezes mais brilhantes". Nossos estômagos embrulhavam. Mas a princípio estávamos lá por um diploma, por uma profissão. A matéria "poluição marinha" era optativa. A informação era repassada, pappers lidos e precisávamos saber para transcrever na prova e receber um número no boletim que ficaria em nosso histórico escolar.

Meu filho era um recém nascido e o cheiro artificial dos produtos de bebê me irritavam. Nenhum era tão prazeroso quanto o cheiro dele. Usava amido de milho quando punha fralda. E conforme foi crescendo ele mesmo rejeitava shampoos, berrava quando lhe caiam nos olhos. Eu lia o rótulo em voz alta "não arde", até que parei de obrigar, os cachinhos se formaram puros e brilhantes. O pai dele se mostrou contrariado. Percebi que já passava da hora de eu abolir o uso de shampoo da minha própria cabeça. E foi o que fiz. Sem alardes reduzi o uso de químicos domésticos ao mínimo possível em uma vida urbana de funcionária pública.


Pra vida marinha não faz a menor diferença se eu uso ou não shampoo. Independente da minha escolha individual, os produtos químicos continuarão a ser produzidos, vendidos e despejados nos corpos hídricos. E por isso não tem sentido algum desgastar minhas relações de afeto para convencer indivíduos a boicotarem a indústria farmacêutica. Não são os consumidores que determinam o que e como será produzido e distribuído. Eu nunca vi alguém comprar um tanque de guerra e ainda assim, são produzidos aos montes. Para esse ano de 2022 tem-se aprovado o gasto de US$ 768 bilhões de dólares para "defesa" dos EUA. A vida não é prioridade num arranjo social assentado sobre a lógica de acúmulo e concentração. 

A gente é que vai levando o cotidiano como pode, quando uso vinagre de maçã produzido pelos companheiros do MST no meu cabelo me fortaleço. Sorrio com os cabelos brilhantes a esvoaçar enquanto procuro de que maneira poderemos superar essa lógica tão nefasta. E produzir violões invés de tanques, inteligência invés de notas, tempo livre invés de produtos tóxicos...

quinta-feira, 17 de março de 2022

O que importa

Temos um chão para pisar.

Talvez as coisas piorem. Talvez as condições necessárias à vida tornem-se ainda mais inacessíveis. Nesse cenário de guerra, em que as "nações" respondem ampliando investimento em arsenal bélico. O suporte natural chega no seu limite, a quantidade de pessoas que migram em consequência das alterações climáticas aumenta vertiginosamente sem nenhuma política séria de mitigação em todo ocidente midiático. Mais bombas são produzidas, mais tecnologia para qualificar mísseis. 

Não é o rumo social que queremos e trabalhamos como podemos para alterá-lo. Esperamos a dissolução da OTAN, acordos de desarmamento, investimentos pesados em reflorestamento, mitigação ambiental, alteração de matriz energética. Esperamos, e trabalhamos apontando as possibilidades de caminhar nessa direção. Mas, percebemos o quanto que as políticas de destruição se impõe. Quem sabe a aproximação de um cenário catastrófico alimente a fome de acumular, de salvar a si próprio, foguetes pra marte, bunkers abastecidos, sítios cercados com fonte de água pura. Ações que confirmam a percepção do tamanho caos social em que estamos. Saber disso e não se desesperar. Saber disso e justamente tornar-se mais e mais generoso. Nesse cenário catastrófico. O que nos importa manter da humanidade é o amor, a capacidade de construir relações pautadas no respeito à vida em sua potência. É isso que precisamos salvar e resguardar. Enquanto a lógica de apropriação e dominação rui, não é possível que se sustente, que se perpetue, não é possível pois não há "recursos naturais" pra isso, ademais pulsamos por florir e esse cenário tóxico não é favorável ao florescer humano. Nos mantemos firmes no propósito de viabilizar o desenho social que coíba relações abusivas, um modelo no qual o bem viver seja o objetivo de toda a decisão política, e direcionamento financeiro. 

Essa firmeza vem do chão. 

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2022

 

Rupturas são parte da vida. E também da morte. Uma porta me fechou na cara. Talvez em grande medida por me recusar a não aceitar meu corpo. Me recusar a esconde-lo. Por isso sou constantemente punida, e cobiçada. As tempestades não vem só. Fragilizada, revendo minha vida afetiva-sexual me dando as costas. O cachorro adoece. O cachorro que acabou por se tornar o único elo com minha juventude. Mudei de casa, de rua, de cidade, de estado, as pessoas mudaram, afastaram, morreram, só o cachorro ficou. Agora, a vida vai se afastando dele, a vitalidade diminui, as pernas traseiras fracas, as doenças lhe tomam, e eu choro. Choro as rupturas, presentes, passadas e futuras, os abandonos, as dores, eu choro tomada pelas emoções dependo de pessoas próximas para trazerem alguma razão, alguma ordem em todo esse caos.

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2022

Iemanjá mãe de todos os orixás


Iemanjá! Divindade da Fertilidade. Relacionada às águas - nascentes e desembocaduras - essas emoções que fluem, ciclo caótico de nascer, viver, morrer... 

A sagrada maternidade é fluir de líquidos. Nossa concepção, por natureza, inicia com o gozo. Molhado. E dentro desse corpo de água forma-se o oceano primitivo. O qual deságua no nascer. Momento tomado de Ocitocina - amor e prazer. É o prazer vindo das águas que traz a vida. 

Mãe é o impulso de vida que vem de fora e reverbera em amor e prazer. Começa no óvulo, no sexo, na gestação, no parto e segue em todas as ações e relações que potencializam a vida, que inundam de ocitocina: alimento, sexo, amizade, prazer, luta - tudo isso tem um “que” de mãe, de água, de Iemanjá.