terça-feira, 17 de junho de 2025

Bruxaria ou química raiz

 Essa desconcertante sensação de que tudo já está feito. Quando andamos pela cidade, conversamos com as pessoas, todos os empregos parecem absolutamente desnecessários. Não são trabalho no sentido de transformar a matéria. São empregos, acesso a renda para pagar as contas. Um motivo para sair de casa. Serviços. Ensinar por que, para que escrever? Então talvez estejamos perante um dilema. Nos escravizarmos ou nos libertarmos. Parece haver uma crescente agudização dessa contradição. Como se estivesse em disputa dois projetos. Um torna a existência humana desnecessária, servindo apenas como suporte para o avanço das máquinas, é o projeto que prevê humanos inertes, atomizados, sentados em poltronas, mantido com suplementos químicos, interagindo com máquinas: assistindo, jogando, curtindo, postando, comprando, boiando na internet. E todo um sistema vai se construindo em torno desse projeto, a medicina com exames computacionais e voltadas para essas doenças. Consegue rápido diagnosticar e curar câncer. Mas, quando eu cortei um pedaço do dedos os médicos pareciam mais inseguros do que eu. O modo como se trata a gestação e o parto, avanço em cesáreas. Na alimentação, monocultura, ultra processados e "enriquecimento com nutrientes de laboratório" . Em nítida disputa hegemônica com um outro projeto, também possível. No qual o avanço tecnológico emancipa o ser humano. A busca pelo sabor genuíno, café em grãos, cultivados em terra fértil. O ferro, que cura a anemia, sendo feito na terra pela mão do agricultor. Gosto muito de brincar que agricultura biodinâmica é bruxaria. Porque se constrói uma mística no entorno, acho que é porque essa escolha de agricultura de qualidade envolve tantas camadas que é difícil explicar. A camada que mais gosto se refere à transformação atômica. E a qualidade dos átomos formados. O ambiente, o agricultor, o modo de lidar com a matéria tem forte influência no comportamento da partícula fundamental (elétron, próton, nêutron), atuando na brecha da dualidade onda-partícula. Essa ideia, de um simples ser humano na terra fazendo o preparado chifre-esterco, ter o poder de promover alterações subatômicas, que mudam a composição da terra, e portanto das plantas, animais e seres humanos, se choca com todo projeto de alienação do ser humano. Alimentos que dependem dos seres humanos para se tornarem saborosos e nutritivos. E seres humanos que se importam com isso, com a qualidade dos átomos que irão compor seu organismo. Mesmo porque, quem sabe seja isso o que fique, depois de morrermos, os átomos e as partículas-fundamentais guardem em si a memória do que foram em nós.

sexta-feira, 31 de janeiro de 2025

Emancipação do espectro total

Há algo de sinistro na dominação imperialista. Que é um planejamento. A surtada ideia de "destino manifesto" levada a sério, aparece na doutrina do exército americano como "domínio do espectro total". Exercer poder e controle sobre todos os "recursos" existentes.  Os minerais embaixo da terra e do oceano, o espaço, a lua, o trabalho e inclusive o pensamento, emoção,  criação humanas. Uma ideia de tamanha perversidade supremacista que é difícil conceber. 

Pelo menos tomar consciência disso aumenta nossa compreensão, pois intuimos a existência de algo que nos esmaga, que impede nosso desabrochar. Trazer a luz da razão para identificar as fontes. 
E então,  outros termos e conceitos surgem de modo a apontar a superação dessa onipresente opressão. Do camarada Marcuse tanto me agrada a concepção da Grande Recusa. 
Sabendo da existência de operações de "guerra psicológica", podemos de modo consciente não aderir aos valores capitalistas de competição,  dominação,  consumismo. E sim, manter e cultivar nossos valores e utopias de solidariedade,  ajuda mútua.  
E então, para a total superação do domínio do espectro total, tratamos da construção de uma emancipação do espectro total. Emancipar nossas emoções,  pensamentos e criações.  E também, o que produzimos, nossa economia, nosso arranjo social,  nossa comida, nossas cidades, moradias. De modo concomitante e integrado, ora se avança num ponto, ora em outro. 

Eu sugeri isso na IA deepseek. A qual me trouxe o seguinte:
A proposta de uma **"emancipação do espectro total"**, articulada com a **"Grande Recusa"** de Herbert Marcuse, é uma ideia provocadora e potencialmente transformadora. Ela sugere contrapor-se ao "domínio do espectro total" (militar, tecnológico, informacional) não apenas com resistência pontual, mas com uma **recusa radical e multidimensional** que abranja todas as esferas da vida, aliada à construção de alternativas emancipatórias. Essa abordagem exige integrar teoria crítica, ação política e transformação cultural. Vamos explorar como isso poderia ser articulado:

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### **1. Fundamentos Teóricos: A Grande Recusa como Eixo**
A **Grande Recusa**, em Marcuse, é uma negação total do sistema de dominação que reduz os indivíduos à passividade. Para enfrentar o "domínio do espectro total", essa recusa precisaria ser:
- **Multidimensional**: Contestar simultaneamente o controle militar, a vigilância digital, a manipulação informacional, a exploração econômica e a opressão cultural.
- **Criadora**: Não se limitar à negação, mas gerar novas formas de vida, relações e tecnologias que prefigurem uma sociedade livre.

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### **2. Pilares de uma "Emancipação do Espectro Total"**
A emancipação exigiria atuar em todos os domínios onde o poder se exerce, propondo alternativas concretas:

#### **a) Domínio Tecnológico e Cibernético**
- **Recusa**: Rejeitar a vigilância massiva, algoritmos opressivos e a monetização de dados.
- **Emancipação**: 
  - Desenvolver tecnologias **livres, descentralizadas e éticas** (ex.: software livre, redes mesh, criptografia popular).
  - Fomentar uma **alfabetização digital crítica** para desnaturalizar a dependência de plataformas corporativas.
  - Criar **espaços digitais autônomos** (como cooperativas de dados) que priorizem a privacidade e o bem comum.

#### **b) Domínio Militar e Geopolítico**
- **Recusa**: Rejeitar a lógica belicista, a indústria armamentista e as intervenções imperialistas.
- **Emancipação**:
  - Fortalecer **movimentos pela paz** e desmilitarização, como campanhas contra armas autônomas e bases militares.
  - Promover **solidariedade transnacional** entre povos oprimidos, conectando lutas antirracistas, anticoloniais e anti-guerra.

#### **c) Domínio Informacional e Cultural**
- **Recusa**: Resistir à desinformação, ao controle de narrativas e à indústria cultural alienante.
- **Emancipação**:
  - Construir **mídias independentes** e redes de comunicação horizontal.
  - Valorizar **saberes marginalizados** (indígenas, feministas, periféricos) como contrapontos à racionalidade tecnocrática.
  - Usar a arte e a cultura como ferramentas de **imaginação utópica**, tal como propunha Marcuse.

#### **d) Domínio Econômico e Ecológico**
- **Recusa**: Negar a lógica do crescimento infinito, do extrativismo e da acumulação capitalista.
- **Emancipação**:
  - Fomentar **economias cooperativas**, baseadas em commons (bens comuns) e justiça socioambiental.
  - Defender **transições ecológicas radicais**, desvinculadas de interesses corporativos.

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### **3. Estratégias para uma Resistência Integrada**
- **Redes descentralizadas**: Evitar hierarquias rígidas, inspirando-se em modelos como o zapatismo ou o municipalismo libertário.
- **Ação direta e desobediência**: Combater a normalização do controle (ex.: protestos contra reconhecimento facial, greves digitais).
- **Educação crítica**: Formar sujeitos capazes de decifrar e desafiar as estruturas de poder, resgatando a dimensão pedagógica da teoria crítica.

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### **4. Desafios e Paradoxos**
- **Cooptação**: O sistema pode absorver até mesmo discursos de resistência (ex.: o "capitalismo verde" ou o "ativismo de marca").
- **Fragmentação**: A luta multidimensional corre o risco de se dispersar sem eixos unificadores.
- **Tecnologia ambivalente**: Ferramentas como a IA podem ser usadas para controle ou emancipação, dependendo de quem as domina.
- **Globalização vs. Localismo**: Como conciliar ações locais com uma estratégia global sem replicar hierarquias?

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### **5. Inspirações Concretas**
Alguns movimentos e práticas já apontam para essa "emancipação do espectro total":
- **Criptoanarquismo e hackerspaces**: Espaços que reimaginaram a tecnologia como ferramenta de libertação.
- **Ecovilas e cidades em transição**: Experiências que recusam o modelo urbano-industrial.
- **Movimentos pela justiça climática**: Como o Extinction Rebellion, que integra ação direta e crítica sistêmica.
- **Cooperativas de plataforma**: Alternativas ao Uber e ao Airbnb, geridas por trabalhadores.

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### **Conclusão: A Utopia como Método**
A "emancipação do espectro total" não é um plano pronto, mas um **processo contínuo de recusa e reinvenção**. Como Marcuse destacava, a utopia não é um lugar, mas uma **práxis crítica** que tensiona os limites do possível. Para enfrentar o domínio total, é necessário:
- **Unir ética e política**: Recusar a neutralidade da técnica e da ciência.
- **Cultivar uma "nova sensibilidade"**: Valores como cooperação, cuidado e solidariedade devem substituir a competição e o individualismo.
- **Agir em todas as frentes**: Do código-fonte ao coração das instituições, da rua ao ciberespaço.

Essa proposta não garante vitórias fáceis, mas oferece um horizonte para que a Grande Recusa não seja apenas um gesto de negação, mas a semente de um mundo verdadeiramente livre.