segunda-feira, 23 de setembro de 2024

Licença maternidade

Em 2016, eu tive que voltar a trabalha, enquanto o leite empedrava nos meus seios e meu filho gritava minha ausência. Para além da dor, física e espiritual, escrevi, em busca de comover candidata a prefeita da eleição. Hoje, resgatei a carta e me pareceu adequado compartilhar. 

Houve também alguns "mamaços" organizados, e intervenções de seminários. Hoje a licença maternidade no município é 6 meses. Insuficiente, evidentemente, mas maior que 4.

Excelentíssima sra. x

A primeira infância tem um papel crucial no desenvolvimento e constituição da pessoa. Nessa

fase a presença e o afeto da mãe são de extrema importância, por esse fator muitos países e

empresas alongaram licença maternidade para períodos superiores a um ano. Nesse cenário a

atual licença de 120 dias concedida às funcionárias da prefeitura de Ilhabela, o que

corresponde ao mínimo garantido pela Constituição Federal, nos parece em defasagem se

comparada com outros municípios da região. Fator que certamente afeta negativamente a

sociedade, às mães e futuros cidadãos e cidadãs ilhabelenses. Listamos e desenvolvemos a

seguir os principais argumentos que embasam nossa proposta de ampliação da licença para,

pelo menos 180 dias.


- Ilhabela aderiu ao programa estadual Primeiríssima Infância, tal programa em consonância

com o programa federal Criança Feliz ressalta a importância da fase inicial de 0 a 3 anos para a

constituição do ser humano. Sendo uma premissa básica dessa fase o pleno contato com a

mãe e a amamentação em livre demanda;


- compromisso assumido pelo Governo Brasileiro na Reunião de Cúpula em Favor da Infância,

realizada em Nova Iorque em 1990, de promover, proteger e apoiar o aleitamento exclusivo,

nos primeiros 6 (seis) meses de vida, e continuado, até os 2 (dois) anos ou mais de idade;

(ANVISA, 222/02; Portaria SAS/MS nº 756 de 16 de dezembro de 2004);


- o período mínimo de 6 meses para licença maternidade já é largamente praticado no Brasil,

gozam desse direito as funcionárias do governo federal (Decreto 6.690/11 de dezembro de

2008), governo do estado de São Paulo (L. 10.261/68 - Art. 198, I, com redação dada pela LC

1054/08, e art. 324; L. 500/74 - Art. 25), de outras cidades da região (Caraguatatuba, LC 25/07

Art 125; São Sebastião, LC 146/11 - Art 175). Além das empresas privadas, as quais recebem

incentivos fiscais por meio do Programa Empresa Cidadã (Lei 11.770/2008);


- a Organização Mundial de Saúde - OMS da UNICEF recomenda o aleitamento exclusivo no

peito até 6 meses, sendo essa uma medida importante para redução da mortalidade infantil.

Em sua cartilha para América Latina e Caribe reconhece a legislação com um obstáculo, e

sugere leis que garantam a oportunidade de contato entre as mães e bebês (OPAS/OMS,

2016) ;


- o período de licença maternidade de seis meses é recomendado pela Sociedade Brasileira de

Pediatria – SBP, pois neste período a criança alimenta-se exclusivamente do leite materno, o

que reduz 17 vezes as chances de a criança contrair pneumonia, 5,4 vezes a possibilidade de

anemia e 2,5 vezes a ameaça de crises de diarreia. Em 2012 a Sociedade Brasileira de Pediatria

realizou uma campanha pela ampliação da licença maternidade por entender que “Os seis

primeiros meses são insubstituíveis para o crescimento e para o desenvolvimento do bebê,

para o fortalecimento do vínculo afetivo entre mulher e o filho e para o aleitamento materno

exclusivo, conforme recomendamos”, dr. Eduardo Vaz (Sociedade Brasileira de Pediatria, 2016)


- para além da indiscutível importância nutricional, o contato constante é fundamental para o

fortalecimento do vínculo entre mãe e bebê, o que contribui para o desenvolvimento

emocional, algo crucial na formação de um adulto seguro. Atualmente, muitos profissionais

renomados relatam a importância do contato constante do bebe com a mãe, a psicanalista

Laura Gutman afirma que o campo emocional é compartilhado entre a díade mãe-bebe até

aproximadamente dois anos de vida (Gutman, 2010) . Esta experiência de continuidade do ser

do bebê com a mãe é também defendida por Winnicot, para quem as bases da saúde mental

de qualquer indivíduo são amoldadas na primeira infância pela mãe, através do meio ambiente

fornecido por esta. Para Bowlby a relação entre o bebê e sua mãe não se dá pela alimentação,

mas sim pela sentimento de segurança. “É destacada a afetividade, e enfatizado seu papel

constitutivo nas interações, de fundamental importância no desenvolvimento infantil.” ( Seidl-

de-Moura, et al.) ;


- o renomado pediatra Carlos Gonzalez, argumenta sobre a importância da amamentação em

livre demanda, isso é no momento em que o bebê necessitar e por quanto tempo ele precisar.

Dessa forma, mesmo os intervalos de trinta minutos previstos na CLT não são adequados para

atender em sua totalidade as necessidades desse frágil e importante período de vida;


- por reconhecer a importância desse período muitos países permitem que os bebês vivenciem

plenamente a relação com sua mãe por até mais de um ano. Em destaque, estão os países de

economia mais forte, como o Reino Unido, com 315 dias de licença; a Noruega, também com

315; a Suécia, com 240; e os países do leste europeu como a Croácia, com 410 dias de licença –

o país com maior tempo de licença maternidade no mundo todo. Montenegro, Bósnia e

Albânia também oferecem um período bom de afastamento para as mães que acabaram de

ter filhos: 1 ano de licença;


- inclusive empresas privadas, que visam lucro, ao compreenderem a importância desse

momento para o desenvolvimento humano e para a saúde psíquica da funcionária mãe, em

vista do balanço financeiro, adotam licença maternidade de um ano, um exemplo é a empresa

Netflix (BBC, 2016) ;


- em termos econômicos trata-se de um investimento a longo prazo “segundo James J

Heckman, da universidade de Chicago, Premio Nobel de Economia em 2000, investir na

primeira infância é o caminho mais lógico para reduzir déficits e fortalecer a economia, além

de ser uma efetiva estratégia para reduzir custos sociais e promover o crescimento econômico

[...] O Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) afirma que um dólar investido nessa

faixa etária gera economia de sete dólares em assistência social, atendimento a doenças

mentais, manutenção de sistemas prisionais, repetência e em evasão escolar e 15 dólares

por pessoa em doenças que continuam a se manifestar na vida adulta, como depressões,

suicídios, homicídios, abusos de drogas, sintomas físicos entre outros.” (Zero a Seis, 2016) ;


- em entrevista à Radio Senado, o senador Alvaro Dias afirmou que a proposta (de ampliação

da licença) é um benefício social e não um fator adicional de custos para as empresas. De

acordo com o parlamentar, ela está de acordo com a Convenção 103 da Organização

Internacional do Trabalho, segundo a qual a maior permanência da mãe com o filho, ou filha

não só contribui para o desenvolvimento do pequeno mas também melhora o desempenho da

mulher no trabalho (Mulher, 2016) ;


- propostas de alteração nas leis federais: Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 64/07,

que torna obrigatória a licença por 180 dias (já aprovada no Senado). Projeto de Lei nº

6.273/09, que reduz em duas horas a carga horária diária de trabalho da mulher grávida, a

partir do sétimo mês de gestação. A PEC 41/2015 está na Comissão de Constituição e Justiça.

Diante do exposto, convidamos vossa excelência a refletir sobre o tema, e nos apoiar com

vossa influencia, no movimento para ampliação da licença maternidade. De modo que Ilhabela

siga no caminho de se tornar referência quanto à atenção humana e sensibilizada dessa fase.

Propomos ainda, que um passo à frente seja dado ao possibilitar à mãe a opção de um

afastamento maior, que os 180 dias já previsto e muitos municípios, com a redução ou

supressão salarial. Tomando como exemplo a conduta alemã.


Bibliografia

Seidl-de-Moura, M. L., Ribas, A. F., Seabra, K. d., Pessôa, L. F., Susana , E. N., Mendes, D. L., . . .

Vicente, C. C. (s.d.). Interações Mãe-Bebê de Um e Cinco Meses: Aspectos Afetivos.

Psicologia: Reflexão e Crítica, 21(1), pp. 66-73.

BBC. (24 de 10 de 2016). Fonte:

http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/08/150812_licenca_maternidade_paises_rm

Gutman, L. (2010). A maternidade e o encontro com a própria sombra. Best Seller.

Mulher, M. d. (24 de 10 de 2016). Fonte:

http://mdemulher.abril.com.br/familia/bebe/senador-propoe-extensao-das-licencas-

paternidade-e-maternidade

Sociedade Brasileira de Pediatria. (24 de 10 de 2016). Fonte:

http://www.sbp.com.br/campanhas/em-andamento/licenca-maternidade-6-meses-e-

melhor/

Zero a Seis. (24 de 10 de 2016). Fonte: http://zeroaseis.org.br/o-instituto/primeira-infancia/

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